quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Dona Joaquina e os seus três maridos



Durante pelo menos todo o Séc. XIX e, ainda, durante a primeira metade do Séc. XX era vulgar na nossa região que as pessoas se casassem mais de uma vez.
Tal, tinha duas razões:
Uma, evidente, o falecimento prematuro de um dos cônjuges, fosse na sequência de acidente (tétano), complicações inerentes ao parto, ou as muitas doenças epidémicas que assolaram os anos de 1800, sobretudo o tifo e a cólera e as primeiras décadas do Séc. XX, aqui, ainda o tifo mas, sobretudo, a pneumónica e a tuberculose.
A outra, a quase impossibilidade de sobrevivência de uma pessoa adulta solitária, muito menos quando, como em geral era o caso, tinha filhos menores.
Ainda que não tivesse filhos. A verdade é que uma acentuada especialização da educação, fazia com que um homem nada soubesse das tarefas domésticas, nem a mulher estivesse apta ao exercício da generalidade das tarefas de exterior, caracterizadas, aliás, por exigirem, em regra, um grande esforço físico.

O homem e a mulher eram, assim, verdadeiramente complementares e, unidos, tinham muito melhores condições para enfrentar as dificuldades quotidianas.

A D. Joaquina Marques, essa, casou por três vezes:

1858
Ataija de
Sima
Joaquina
Marques
m.er de Joaq.im
Verissimo.
Aos nove dias do mez de Fevereiro de mil oito centos, e cincoenta, e oito, falleceo e foi sepultada no Adro d’esta Parochial Igreja de S. Vicente d’Aljubarrota, tendo recebido os Sacramentos da Penitencia, Sagrado Viático, e Extrema Unção Joaquina Marques, cazada com Joaquim Verissimo d’Ataija de Sima. Fez disposição verbal deixou a terça dos seus bens a seo Marido e pela sua alma quinze Missas e pelas almas de seos dous defuntos Maridos dez, e uma oliveira á Confraria do SS.mo sacramento desta Freguesia, do que para constar fiz este assento, que assignarão como testemunhas Joaquim da Roza Sacristão, e Manoel Francisco Torneiro, dia, mez, e anno ut supra.
O Parocho Manuel Vieira da Silva            
Test.as
Joaquim da Roza                      Mel + Fr.o Tornro

  
O que levou a Joaquina Marques a casar três vezes?
O primeiro marido, João Vieira, morreu em 1826 e deixou uma filha (Maria da Graça), com 12 anos.
O casamento seguinte foi, ainda, mais breve já que o marido, Joaquim Antunes, veio a falecer logo em Julho de 1833, durante a epidemia de cólera que, então, assolou a Ataíja de Cima e de que, noutra ocasião, havemos de falar com mais pormenor.
Nessa altura, em 1833, a Joaquina Marques teria cerca de quarenta anos e já estava viúva duas vezes!

Do terceiro casamento, não houve filhos, ao menos que tivessem sobrevivido. Ou seja, o marido Joaquim Veríssimo, não tinha descendentes.
Porquê, então, a deixa que lhe faz a falecida, com aparente prejuízo de sua filha Maria da Graça?
Claramente, a Joaquina Marques quer assegurar as melhores condições ao seu sobrevivo marido mas, ao contrário do que parece, sem prejudicar a filha.
Trata-se de testamentos cruzados.
É que, por sua vez e como se vê do respectivo assento de óbito, o Joaquim Veríssimo fez testamento a favor de João Maria Cláudio de Souza, genro da Joaquina Marques.

O que me chamou a atenção para este assento de óbito foi a disposição testamentária pela qual a Joaquina Marques manda que se rezem, “pelas almas de seos dous defuntos Maridos dez” missas. Foi essa naturalidade na assunção da pluralidade de casamentos, a qual leva a que todos os três maridos sejam objecto das últimas atenções da moribunda, que me despertou a curiosidade.


Descobrir que a Joaquina Marques e o seu primeiro marido, João Vieira, foram meus tetravôs, é um pormenor. 

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