segunda-feira, 30 de março de 2015

Casal Novo - Uma aldeia abandonada

 


Ao consultar o mapa elaborado em 1791 para a construção da estrada de Rio Maior a Leiria[i], verificámos que nele se identifica, a norte e muito próximo do Vale Vazão (aí designado Casal do Vazão), a localidade do Casal Novo de que falámos num texto publicado neste blog, em 2011 e, então julgávamos, erradamente, pertencer à freguesia de São Vicente de Aljubarrota.

Não é o caso uma vez que, de facto, o território onde se encontra a aldeia, agora em ruínas, do Casal Novo, integra a freguesia do Juncal. É certo que, num extremo dela, uma cunha apontada ao Vale Vazão, uma ponta de lança entrando em território de S. Vicente.

(Pormenor do Mapa da Estrada de Rio Maior a Leiria, de 1791)


Das Memórias Paroquiais, de 1758, não resulta claro se este Casal Novo já então existia ou não.
É que, na descrição dos lugares que constituem a freguesia do Juncal, diz o respectivo pároco[ii] que a Cumeira é aldeia que fica a uma distância de meia-légua para o lado do sul[iii] e tem 13 casas e quarenta e três pessoas e, “logo adeante”, fica Marco e Casal, “que tem dez fogos e pessoas vinte e cinco”.
E, mais não diz.

No entanto, tendo usado na ordem de descrição dos lugares da freguesia o critério de nomear primeiro os que ficam a norte e a poente da paróquia e, só depois, os que ficam a sul e a nascente, duvidas não há de que este “Marco e Casal” ficava (ou ficavam? Eram um ou dois povoados?) a sul da Cumeira (de Cima).
Aí, a poente da estrada nacional 8, ainda a carta militar de 1969 identificava o lugar de Casal Velho, nos nossos dias reduzido a uma “Rua do Casal Velho” e, a nascente daquela estrada e continuando para sudeste, o Casal de Além e o Casal Novo este, já então representado, sobretudo, por ruínas[iv].

Notícias concretas (notícias com gente dentro) do Casal Novo encontrámo-las nos registos paroquiais de São Vicente de Aljubarrota[v], do que é exemplo o casamento celebrado em 24 de Novembro de 1804, entre Joaquim Martins, natural do Casal Novo, onde residia e Ana Maria, da Maiorga. 
O pai do noivo era nascido no Casal Novo mas a mãe era natural da Ataíja de Cima, onde os noivos fixaram residência. 


Seja como for, este Casal Novo, foi um casal efémero que se encontra desabitado desde meados do Séc. XX[vi] e do qual, hoje em dia, apenas restam ruínas das construções há muito abandonadas.


Visitámo-lo há cerca de dois anos e as fotografias seguintes mostram o estado em que, então, se encontrava (Nota: O local é acessível por veículo todo o terreno ou bicicleta):

Um olhar atento (notem-se as janelas entaipadas) mostra-nos que, depois de deixar de servir de habitação, esta casa teve outros usos. 


A padieira com seu escarção (na Ataíja diz-se pavieira que, aliás, é forma igualmente aceitável).
Padieira ou verga é a peça (na construção tradicional de pedra ou de madeira) que fecha, superiormente, os vãos das portas e das janelas.
Escarção (aqui formado pelas duas pedras colocadas obliquamente sobre a padieira), é o arco que se coloca sobre a padieira para evitar que sobre ela recaia todo o peso da construção que lhe fica por cima (descarregando esse peso sobre as ombreiras). 
  
  

Aqui era uma cozinha, como se vê da parede suja de fumo e da reentrância destinada à guarda de alimentos e, ou, pratos, tachos e outros utensílios da cozinha. (Em casa da minha avó havia uma reentrância assim, a que ela chamava "a buraca" e tinha uma porta de rede. Aí se guardava o pão, o peixe frito, queijos, o açúcar, a massa e o arroz, etc.)


A Natureza tem horror ao vazio


Os do Casal Novo tinham uma bela vista para a serra dos Candeeiros


No meio da vegetação que tudo invade vislumbram-se os restos do que foi um forno de cozer pão.


Uma pedra de coice, (ou, coiceira), há muito inútil por falta de porta





[i] Sobre a Estrada de Rio Maior a Leiria (estrada de D. Maria Pia), consulte-se o interessante livro de Ricardo Charter’s de Azevedo, “A Estrada de Rio Maior a Leiria em 1791”, colecção Tempos&Vidas-15, Edição Textiverso, Leiria, 2011.
[ii] A Memória Paroquial do Juncal é acessível online em: http://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=4240415
[iii] Da Igreja Paroquial, obviamente.
[iv] Na Carta Militar de 2004, já não aparece qualquer referência a Casal Novo. O local é agora identificado por Chão da Mança o que, aliás, nos remete para a enorme qualidade do Mapa de 1791 que, como se pode ver, já aí identificava uma “Fonte da Mança”.
[v] E, muitas mais há-de haver nos registos paroquiais do Juncal. Mas, isso já está fora do âmbito dos nossos estudos.
[vi] Tenho a informação de que ainda estará vivo no Vale Vazão, ou estava há poucos anos, o que terá sido um dos últimos habitantes do Casal Novo.

sexta-feira, 20 de março de 2015

Vidraço de Ataíja no Santuário de Fátima


"A pedra ataíja com que foram construídas a escadaria e a Basílica de Nossa Senhora do Rosário será o mais usado na nova construção."

Eis uma boa razão para, aqui, dar notícia da construção de um novo presbitério no Santuário de Fátima.


Maquete do novo presbitério que vai ser construído no Santuário de Fátima. 
Foto retirada, coma devida vénia, de: http://www.santuario-fatima.pt/portal/index.php?id=89282, onde os interessadoss poderão consultar mais elementos sobre a obra.

sábado, 14 de março de 2015

Os malefícios do alcoolismo




As reformas administrativas do Liberalismo, primeiro a de Mouzinho da Silveira em 1832 e a de Rodrigo da Fonseca em 1835, tiveram por efeito, neste último ano, a extinção do concelho de Aljubarrota e da freguesia de São Vicente e a integração dos respectivos territórios, respectivamente, no concelho de Alcobaça e na freguesia de Nossa Senhora dos Prazeres[i].

Ao mesmo tempo e em consequência, o Cura José Joaquim Leitão que por longo tempo havia paroquiado S. Vicente, deixou essas funções, agora inexistentes, passando as almas vicentinas a ser pastoreadas pelo titular da freguesia de Prazeres, o Padre Francisco de Freitas Fróis.

Em matéria de registo de óbitos e no que à área da antiga freguesia de São Vicente diz respeito, pode afirmar-se que o Padre Fróis – aliás natural de Aljubarrota onde nasceu no seio de uma importante família local - teve uma entrada, digamos, em grande, espectacular.

O primeiro óbito por ele registado, em 18 de Agosto de 1835, é o de uma importante figura local: Exactamente, o Tabelião José Gomes Coelho, de importância, aliás, claramente acrescida pelo facto de, com a extinção do concelho e, assim, do cartório, ter sido o último Tabelião de Aljubarrota.

O segundo óbito registado pelo Padre Fróis, esse, é o da menos importante das figuras locais:
Um bêbado a quem, por o ser, foi recusado o direito a sepultura eclesiástica e foi enterrado no campo, como os animais.

Ataija de Sª
Thomaz
Francisco
Cazado
Aos vinte e hum de Setembro de mil
e outo centos e trinta e sinco faleceo
e foi sepultado no Campo , não gozando
portanto de Sepultura Eclesiástica
Thomaz Francisco cazado que era
Com Luiza Maria do Lugar de Ataija de
Sima hoje desta Freguesia de Prazeres por
se achar morto no dito dia , e ser publico e no
torio se tomava demasiadamente do vinho de que
morrera embriagado …..….[ii] Consultadas
as Autoridades Eclesiasticas competentes deter
minarão de lhe não ……….[iii] Sepultura em Sa
grado de que fis este assento e Lembrança
para constar esteve exposto sem ser enter
rado dois dias athe dia vinte e três isto athe
aquela decisão: mês e Era supra
a)      Francisco de Freitas Frois

 
A época era conturbada:
A derrota de D. Miguel era ainda recente e as feridas não estavam saradas.
Os frades de Alcobaça haviam abandonado o Mosteiro há menos de dois anos.
Há pouco mais de um ano tinham sido extintas as ordens Religiosas.
1832 e 1833 tinham sido anos terríveis em matéria de  saúde pública na(s) freguesia(s) com o surto de tifo e a epidemia de cólera. Os mortos eram tantos que não cabiam dentro das Igrejas Paroquiais e, principalmente por isso, houve muitos enterramentos nas capelas das aldeias e junto mas fora da Igreja, em lugares (talvez, sempre o mesmo) que em diferentes assentos de óbito se designam por adro, cemitério paroquial ou cemitério da freguesia.
Agora, a extinção do concelho e da freguesia (paróquia) de São Vicente.
Tudo foi sentido como derrotas por uma boa parte da Igreja[iv] que, em geral, era bem mais próxima de D. Miguel que dos Liberais triunfantes.

Talvez eu não tenha razão mas, o facto de em dezenas de anos e muitas centenas de registos consultados[v], não ter encontrado situação semelhante, de recusa de enterramento cristão e inumação no “campo”, em lugar não identificado, leva-me a pensar se não se tratou, este caso, de uma pequena vingança, ou de um aviso aos vivos sobre o que na morte lhes aconteceria, caso na vida se não portassem como bons cristãos.

Ou, talvez este fosse o destino normal dos pecadores. Mas, sobre isso, não possuo qualquer informação.

Curiosamente, é do próprio dia 21 de Setembro de 1835, data do falecimento do bêbedo Thomaz Francisco, o Decreto que determina que “Em todas as Povoações serão estabelecidos Cimiterios Publicos para nelles se enterrarem os mortos.”[vi], Decreto esse que, no seu artigo 13º, determinava:

“Art. 13.° O Parocho, ou qualquer Ecclesiastico beneficiado, que
desde que o Cemiterio estiver designado, e benzido, consentir que algum
cadaver seja enterrado dentro dos templos, ou fóra do Cemiterio,
será, pelo simples facto, privado do beneficio, e ficará inhabil para obter
outro.”

Apesar do que, ainda em 1852 e 1853, se procedeu a enterramentos no interior da Capela dos Casais de Santa Teresa, tal como em 1851 tinha havido enterramentos nas capelas da Pedreira (Molianos) e na da Ataíja de Cima e, em 1849, na Capela de Chequeda.



Ao contrário da destes dois anónimos chineses sepultados no Boot Hill de Tombstone, a sepultura campestre do Thomaz Francisco não terá tido qualquer lápide identificativa. Mas, certamente, não deixou de ser coberta de pedras e de silvas, para evitar o ataque de cães e outros necrófagos.




[i] A Portaria de 13 de Janeiro de 1836 mandou que os Passais das Paróquias extintas fossem anexos aos das paróquias onde aquelas se integraram. Ou seja, a anexação de paróquias não importou qualquer diminuição nos bens da Igreja.
[ii] Uma palavra ilegível.
[iii] Idem.
[iv] Que reagiu de maneiras diversas, como se vê na Portaria de 30 de Janeiro de 1836, que responde a dúvidas colocadas pela Junta de Governo do Bispado de Beja (a qual, parece, sugere que a a extinção de paróquias seja precedida de “referendo” local): “… a Circular de 26 d’Outubro ultimo indica mui claramente o modo porque deve proceder-se á anexação das Parochias desnecessárias, e que longe de conceder audiência aos povos na sua totalidade, o que seria absurdo, Ordena que se ouçam somente as Camaras Municipaes:”
[v] Onde há, por ex. mendigos que, por certo, alguns seriam alcoólicos e, viajantes de que se não conhecia o passado.
[vi] Mais de 10 anos depois, ainda a questão da proibição de enterramentos no interior das igrejas havia de ser uma das razões da Revolta da Maria da Fonte.

terça-feira, 3 de março de 2015

Leitoas, Tubaroas, Ratinhas e outras bichas de sete cabeças


Saber de onde vem o nome de um sítio, o que significa, quem, ou quando, ou porquê o atribuiu são, evidentemente, preciosas informações que nos podem elucidar sobre uma infinidade de factos e ajudar a compreender a história ou a formular sobre ela conjecturas coerentes.
Ora, como bem diz Frei Fortunato de São Boaventura, tal como é citado por Eduardo Marrecas Ferreira na sua interessante, única e esquecida monografia “Aljubarrota - Pequena Monografia”, impressa em Lisboa, nas “Oficinas Fernandes”, Rua da Cruz dos Poiais, 103, MCMXXXI:

“… não há um só ermo ou baldio nestes Reinos, a que os povos não tenham dado algum nome…”.

E, sendo certo que os nomes servem para distinguir as pessoas e as coisas umas das outras e, por isso, convém serem diferentes, natural é que alguns desses ermos, baldios ou qualquer espécie de sítio, – que tantos são -, tenham sido baptizados com nomes menos óbvios.

Daí resulta que, em muitos casos, descobrir a razão ou o significado do nome de um lugar se torna um verdadeiro bicho-de-sete-cabeças que são coisa tão complicada e difícil de resolver que o próprio Hércules precisou da ajuda do sobrinho para vencer a Hidra de Lerna.

Hoje, falaremos aqui de um bestiário local ataíjense: bichos, não de sete cabeças mas nomes de bichos (ou, melhor, nomes que parecem nomes de bichos) a designar sítios.

Leitoas.

Na margem do IC2, entre este e o sopé da serra e a Ataíja de Cima e os Casais de Santa Teresa, bem perto e a sul da Chousa do Bruno de que falamos no post anterior, existe um terreno conhecido pelo muito curioso nome de Leitoas (leitôas).

Leitoa é o feminino de leitão e, ambos, são bácoros, porcos pequenos que mamam e, isso não parece ser nome que se dê a um terreno.

O DPLP (disponível online in http://www.priberam.pt/dlpo/Default.aspx) diz no entanto que, andar “em leitão” significa andar nú, em pêlo. Assim leitoa significaria, neste sentido, andar nua. Também, não parece lógico.

O grande arabista e filólogo que foi o Dr. José Pedro Machado diz, por sua vez, no seu Grande Dicionário da Língua Portuguesa que leitoa é uma variedade de pera.
E, António Houaiss, no seu Dicionário Houaiss da Lingua Portuguesa explica que, em linguagem informal, leitoa é qualquer abóbora.

Teríamos, assim, duas hipóteses para a origem deste topónimo: Ou se tratava de terreno especialmente propício para a cultura de abóboras ou, nele, terão existido pereiras leitoas, árvores essas que teriam de ser tão raras por aqui que a sua simples menção identificaria suficientemente o local onde se encontravam.

Tubaroas

Este estranho nome de tubaroas (tubarôas), tibaroas (tibarôas) ou tubarões (tubaroens)  encontrámo-lo em escrituras do Séc. XIX e início do Séc. XX, nestas três diferentes grafias, a identificar um terreno parcelas de cultivo, vinha e mato num sítio junto ao caminho da ponte, perto das Rossanas e do Vale Cordeiro. Terreno esse que, julgo eu, está hoje em dia totalmente integrado nas pedreiras que aí existem.

Não temos, obviamente, a certeza sobre o que terá originado um tal baptismo para este sítio mas, túberas são trufas, cogumelos subterrâneos. 

Eu, não sei nada sobre cogumelos em geral nem, muito menos, sobre trufas em particular. Então, o melhor é dar-vos o link para o artigo Trufas da Wikipédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Trufa, onde se fala das trufas francesas e outras que chegam a valer milhares de dólares por quilo e, um outro link, para um texto onde se fala sobre as trufas portuguesas, as túberas: http://trufa.planetaclix.pt/Tudb.htm.
Leiam estes textos e verão que faz todo o sentido. 
De facto, o Vale Cordeiro e as Tubaroas eram, ainda há poucas décadas, pequenos terrenos de cultivo abertos entre  grandes pedras e com suas testeiras de mato onde sempre havia um carvalho e, sob as copas desses carvalhos, em chão húmido, coberto de ervas sobre o tapete de folhas em decomposição, nasciam, no tempo próprio, cogumelos.
Eu próprio me lembro de andar nesses terrenos acompanhando um apanhador de cogumelos. Não me lembro de, jamais, ter visto ou ouvido falar em túberas.
Mas, lá que faz sentido que um lugar onde nascem túberas se chame tuberoas, isso faz. E, que tuberoas se tenham transformado, com o tempo, em tubaroas, tibaroas e, até, tubarões, também faz todo o sentido.

Ratinha

Na margem esquerda da Ribeira do Mogo, com o principal acesso, a fazer-se a partir da Rua dos Arneiros, pela Rua das Covas.
A nossa família possui aí, a meia encosta, um terreno com algumas características interessantes, partilhadas, aliás, com os terrenos confinantes: o terreno, de mato, muito pedregoso, desenvolve-se em torno de uma linha de água, orientada nascente-poente, que vai até à Ribeira do Mogo. No tempo dos meus avós, o estreito vale era cultivado e, ainda há poucos anos, aí subsistiam oliveiras e figueiras.

O nome Ratinha é comum às diversas propriedades no sítio e, no Séc. XIX, parece ter servido para designar toda aquela zona, incluindo a várzea que se desenvolve no fundo do vale da ribeira do Mogo, como se vê de uma escritura de 1890 que teve por objecto a compra e venda de “uma vinha e mata no sítio da Várzea da Ratinha que confronta a Norte com José Carvalho e Visconde de Costa Veiga, Sul com José de Horta, Nascente com caminho e Poente com regueira”.

Que significado terá este nome de sítio?
Rato pequeno fêmea não é, com certeza, apesar de que, por lá haverá muitos ratos do campo. Nem parece que se trate de referência àqueles emigrantes internos que, sazonalmente, desciam das Beiras a trabalhar nos campos do Alentejo.
Dos muitos significados que os dicionários atribuem às palavras ratinho e ratinha há, no entanto, dois que talvez mereçam, para este caso, a nossa atenção:

O DPLP diz que existe um peixe de esqueleto cartilaginoso, semelhante à raia que é conhecido por ratinho, ratão, rato, uja, uje, usga e urze. Por sua vez, urze seria, segundo José Pedro Machado, não ratinha mas ratona, enquanto ratinho seria um outro ou outros peixes, designadamente, o peixe-agulha. Confuso?
Certo é que urze é também o nome de um arbusto de folha miúda e flores em cacho, semelhante ao alecrim que é vulgar em todos os matos da Ataíja e também nos da Ratinha.
Teríamos, assim, um peixe com nome de arbusto e um arbusto que, por vulgar no sítio, o baptizou.

Talvez sim mas, eu prefiro outra hipótese:

Ratinhar é, segundo José Pedro Machado (e o Houaiss concorda), regatear, economizar com avareza, dar com mesquinhez e, por isso, ratinho ou ratinha, há-de ser uma pessoa mesquinha e avarenta.

E, temos, assim, uma boa solução para o nosso problema e, em qualquer caso, material para inventar uma boa história:

Naquele tempo, os matos incultos eram terrenos preciosos. Aí se levavam os rebanhos a pastar e se cortava o mato para servir de cama aos animais e de tapete aos caminhos e se transformar em estrume, para adubar as terras de cultivo. Aí se encontrava a lenha para a fogueira da cozinha e do aquecimento e a madeira indispensável para a feitura de inúmeros objectos e instrumentos e para a construção das casas.
Naquele tempo, dizíamos, todos estes terrenos estavam aforados pelos frades a um velho rabugento, feio e invejoso, mesquinho e avarento que, diariamente, policiava aquelas terras que não explorava (vivia dos juros de empréstimos usurários - tinha uma arca ferrada, uma burra, cheia de dinheiro), impedindo os camponeses de lá pôr sequer um pé, sob pena de os perseguir nas justiças de Aljubarrota e do Abade, até lograr encerrá-los nas masmorras da vila de onde só saíam a troco de pesadas multas.

Por isso, eram as terras do avarento conhecidas por, as do ratinho, a ratinha.

Mais sítios com nomes de bichos, por aqui, só me ocorrem o Olival da Burra, onde já não há burra e que já não é olival e está feito um bairro de casas e o Vale Cordeiro que, agora, é um gigantesco buraco de onde têm saído muitos milhares de toneladas de Vidraço de Ataíja.



E pronto.
Havemos, a seu tempo, de voltar a estas curiosidades da microtoponímia talvez, para os mais gulosos, falando do sítio dos Caramelos que, como sabemos, fica ali naquela ladeira que desce para a Regueira, quando vamos a caminho de Aljubarrota.
É tudo menos óbvio um tal nome.
Que diacho pode aquela ladeira ter a ver com rebuçados feitos de calda de açúcar queimado?


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NOTA: Na linha do apelo que, no último post, fiz aos leitores ataijenses:
Gostaria de poder desenvolver estes textos, como contributo para um dicionário topográfico e toponímico da Ataíja de Cima, com melhor identificação e localização dos diversos terrenos da zona da Ataíja de Cima, quer nas designações que lhes dão as descrições matriciais e registrais quer, apenas, na tradição familiar dos proprietários.
Ficarei muito grato aos leitores que puderem ajudar-me com qualquer informação
(email: jose.quiterio@sapo.pt).