segunda-feira, 18 de maio de 2015

Monumento aos combatentes



O passado domingo, dia 17 de Maio de 2015, foi dia grande na Ataíja de Cima, com as cerimónias relativas à inauguração do monumento que fica a perpetuar, gravados na pedra, os nomes dos ataíjenses que no cumprimento do serviço militar, então obrigatório, participaram na guerra colonial, ou do Ultramar, em Angola, na Guiné e em Moçambique e, ainda, daqueles que participaram na 1ª Guerra Mundial e dos que, durante a 2ª Guerra Mundial, prestaram serviço, em missão de soberania, em Cabo Verde e em Timor.

A legenda do monumento é justa:
Monumento aos
combatentes de Ataíja de Cima
Inaugurado a 17-5-2015

Um monumento é construção ou obra que recorda alguém ou algum facto memorável.

Ouvi, durante os discursos, falar-se em homenagem mas, a verdade é que o monumento existe antes de tudo por vontade desse ataíjenses que, nos anos de 1960 e 1970, estiveram nas guerras em África – e recordo aqui o José Catarino, entretanto falecido e que foi um dos primeiros a falar-me nesta intenção - e, se a iniciativa foi dos próprios que estiveram na Guerra, não seria curial eles pretenderem homenagear-se a si próprios.

Do que se trata a meu ver, é de dar testemunho da importância que tiveram, para cada um, aqueles dois anos das nossas vidas.

Nós tínhamos 20 anos.

Vinte anos que a grande maioria tinha passado aqui, nesta borda da serra dura e difícil onde, então, não haviam estradas alcatroadas, nem electricidade que só cá chegou em 1969, nem gás, nem água canalizada, os veículos automóveis se contavam pelos dedos de uma mão e muitas ruas ainda eram cobertas de mato. Apenas dois ou três, dois, julgo eu, viviam “lá para Lisboa” onde os seus pais estavam emigrados. Dos outros, muitos já conheciam os campos do Bombarral de neles andar às vindimas e, também as quintas dos arredores de Lisboa, das ceifas e do trabalho nas vacarias.

Era esse o nosso mundo e fomos lançados para os confins da África onde tudo era novo e diferente:
As pessoas, a paisagem, as plantas e os animais, a cor e o cheiro da terra e havia a guerra.

Regressámos todos mas alguns, entretanto, foram levados por doenças e acidentes.
Alguns, regressaram e, de imediato, se meteram, a salto, para a França e a Alemanha, à procura de uma vida que não tinham esperança de aqui conseguir.

Os que estamos, a maioria dos que estamos vivos, ainda agora, quarenta ou cinquenta anos depois, se reúne, ano a ano, com os seus camaradas de armas.

E, reúnem-se para rever amizades forjadas em condições muito difíceis e, por isso, duradoiras.
E, reúnem-se para exorcizar fantasmas. Porque a muitos, como bem disse o Fernando Veríssimo, ainda os perseguem as dificuldades e perigos vividos e as marcas que deixaram nas suas memórias e, como também disse o Presidente do Núcleo de Alcobaça da Liga dos Combatentes, afectam profundamente a vida de tantos combatentes que ainda hoje sofrem, perante a quase indiferença da sociedade e dos poderes.
Mas reúnem-se, certamente, para dar evidente testemunho da importância que a guerra teve nas suas vidas.
E, a meu ver, é para dar testemunho da importância que a guerra teve nas nossas vidas que este monumento, ingénuo como nós éramos, se justifica.

Por tudo isso, o domingo dia 17 de Maio de 2015 foi, como já disse um dia grande para a Ataíja de Cima. Um dia diferente porque, como ouvi ao Joaquim Luís, os dias são iguais, as pessoas é que os fazem diferentes.

O Monumento

O monumento, esculpido pelo nosso jovem conterrâneo Nuno Matias, bem como o arranjo do espaço envolvente só foram possíveis graças à generosidade das seguintes empresas, às quais importa agradecer:

Limeport, Unipessoal, Lda. (http://limeport.pt/#!/)
Sousa & Catarino. Lda. (http://sousaecatarino.pt/)
Germano & Cordeiro, Lda.
Alberstone, Unipessoal, Lda. (http://www.alberstone.pt/index.php/pt/)
Marfilpe, Mármores e Granitos, S. A. (http://www.marfilpe.pt/pt/)
Lareiras Sousa, Lda.
Mármores Vigário, Lda. (www.mvc.pt/)



Agradecemos, também, à Câmara Municipal de Alcobaça pela facilitação e colaboração na preparação do largo onde se ergue o monumento (lamentavelmente não consigo, agora, identificar a Sra. Arquitecta que orientou a requalificação do espaço).

Agradecemos, ainda, à Junta de Freguesia de Aljubarrota que participou nessa requalificação, disponibilizando mão-de-obra e materais.

A Inauguração

As cerimónias do dia iniciaram-se com uma missa campal, seguindo-se a inauguração do monumento.
Estiveram presentes o Presidente da Direcção Central da Liga dos Combatentes, Sr. Tenente General Joaquim Chito Rodrigues, representantes das unidades militares da região, o Presidente do Núcleo de Alcobaça da Liga dos Combatentes, Sr. Joaquim Romão, os Presidentes da Câmara Municipal de Alcobaça e da Junta de Freguesia de Aljubarrota, o Sr. Padre Ramiro, representantes dos Núcleos da Liga dos Combatentes de Alcobaça, Batalha, Leiria, Marinha Grande, Peniche e Rio Maior.
As honras militares foram prestadas por um destacamento da Escola de Sargentos do Exército.

O Convívio

Seguiu-se um almoço convívio, no Salão Cultural Ataíjense, com a participação de mais de 200 pessoas, no final, animado pelo Grupo Coral Alentejano dos Serviços Sociais das Autarquias do Seixal, cuja actuação foi, infelizmente, prejudicada pelas deficientes condições acústicas e pelo Grupo de Concertinas Aldeias do Baça.

Agradecimentos finais

Tendo a certeza de, aqui, falar em nome de todos, importa dizer que os combatentes ataijenses estão muito gratos a muitas pessoas, instituições e empresas, - lamentando não poder mencioná-las a todas especificadamente – que, de algum modo, colaboraram na realização do monumento e no dia da sua inauguração.

Ao Núcleo de Alcobaça da Liga dos Combatentes, agradecemos a preciosa colaboração e apoio, sem os quais nada teria sido possível, e o impecável e rigoroso guião com que organizou as cerimónias do dia e lhes conferiu uma dignidade que a todos honra.

Ao Sr. General Joaquim Chito Rodrigues que nos honrou com a sua presença, obrigado por isso e porque quis estar connosco muito para além do tempo que o protocolo exigiria.
  
Combatentes ataíjenses

Na base do monumento inscrevem-se os nomes dos ataijenses que, no Séc. XX, participaram em guerras ou missões de soberania. São eles:

Angola
Francisco Coelho Agostinho
Francisco Constantino Coelho
João Cordeiro Quitério (João de Sousa Quitério)
José Coelho Matias
Manuel Graça Veríssimo
José Graça Coelho
João Tomás Coelho
Joaquim Coelho Agostinho
António Graça Salgueiro
José Henriques de Horta
José Dias Vigário
José Henriques Salgueiro
Alberto Tomás Coelho
Francisco Constantino Branco
Eduardo Cordeiro Dias
Francisco Eleutério dos Santos
José Lourenço de Sousa
José Marques Coelho
António Coelho Matias
Fernando Graça Veríssimo
José Gomes Sousa

Guiné
Francisco Maurício Vigário
José Ribeiro Vigário
Francisco Silva Salgueiro
José Cordeiro Catarino
Joaquim Costa Moura
José Graça L. Quitério
João Vigário Bernardino
Rafael Matos Maurício

Moçambique
João Félix Sousa
José Constantino Júnior
Joaquim Lourenço Machado

1ª Guerra Mundial
José Constantino
Luís Dias Vigário

Cabo Verde
João Manuel Sousa
José Graça Salgueiro

Timor
António Luís Sousa




Honras militares, após o descerramento do monumento


Um aspecto do Salão Cultural Ataijense durante o almoço


 O Grupo Coral Alentejano dos Serviços Sociais das Autarquias do Seixal, durante a sua actuação


 O Zé da Ilda preparando-se para apresentar o Grupo de Concertinas Aldeias do Baça


O Nuno Matias, junto da sua obra


quarta-feira, 13 de maio de 2015

A propósito do Acordo Ortográfico




Entra hoje, oficialmente, em vigor o Acordo Ortográfico de 1990, de que tanta gente fala – há tantos anos – e tão poucos se deram ao trabalho de conhecer.

Este blog, naturalmente, ambiciona ser lido e conhecido e é, nesse sentido, um transmissor da língua portuguesa e apresentarem-se bem ou mal escritos os textos nele publicados, quer dizer, com grafia correcta ou incorrecta, não será, talvez, indiferente.

Considero, por isso, ser meu dever esclarecer os leitores da minha posição pessoal sobre o assunto Acordo Ortográfico.

A meu ver, a nova ortografia oficial sofre de erros e problemas evidentes e injustificáveis. É verdade, por exemplo, que entre outras soluções muito questionáveis, o dito Acordo move, como alguém disse "uma 'guerra religiosa' de caça às consoantes mudas".

Dito isto, a generalidade dos argumentos dos mais ferrenhos opositores do Acordo não convence. 
O célebre exemplo do cágado e do cagado que seria cagádo, não passa de uma boutade (é assim, a palavra francesa boutade tem uma boa meia dúzia de equivalentes em português: graça, brincadeira, bazófia, piada, piada, chiste mas, para a nossa arreigada saloiice, sempre foi muito chique (e sai mais um galicismo), até entre alguns dos mais estrénuos defensores da anterior ortografia oficial, meter no discurso umas palavras de estrangeiro).

A verdade é que eu acordo todas as manhãs e nunca preocupado com o acordo.

A intervenção estatal na ortografia do português começa com a Reforma Ortográfica de 1911 (vale bem a pena ler o “Relatório da Comissão nomeada, por portaria de 15 de fevereiro de 1911, para fixar as bases da ortografia que deve ser adoptada nas escolas e nos documentos oficiais e outras publicações feitas por conta do Estado” que foi publicado no Diário de Governo, n.º 213, de 12 de setembro de 1911 e está disponível online, em PDF, em:  https://dre.pt/application/dir/pdfgratis/1911/09/21300.pdf)

Depois disso, há um longo rol de tentativas de realizar o que se me afigura virtualmente impossível: a uniformização da ortografia do português em todos os países que o usam como língua oficial (v. http://pt.wikipedia.org/wiki/Ortografia_da_l%C3%ADngua_portuguesa)

Pela minha parte, como já disse, esta é uma questão que me não preocupa. Continuarei, por isso, a escrever sem atender à conformidade ou desconformidade com o Acordo.
Mas não vejam nisso, os inimigos do Acordo, alguma devoção particular à anterior ortografia nem, muito menos, qualquer presunção – que seria absolutamente estúpida - de que o que eu aprendi na escola é que era o verdadeiro português (e, a ortografia do português que eu aprendi foi diferente da que o meu pai teria aprendido se pudesse ter ido à escola e, também, diferente da que os meus filhos aprenderam).


O problema da língua portuguesa não é o modo como é escrita.
É o ser tão pouco lida.