terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Quando a festa de Nossa Senhora da Graça se celebrava no dia 1 de Janeiro (II)

No post com o mesmo título, publicado em 29 de Maio de 2010, (aqui) aludimos aos interrogatórios sobre as paróquias e povoações, que o Marquês de Pombal, em 18 de Janeiro de 1758, solicitou, através dos prelados, a todos os párocos do Reino e cujos relatórios são conhecidos por Memórias Paroquais. Transcrevemos então uma parte do Relatório do Cura de São Vicente de Aljubarrota, no qual dá conta que a festa de Nossa Senhora da Graça, Padroeira da Ataíja de Cima, era então celebrada a 1 de Janeiro, dia em que, actualmente, toda a Igreja Católica vive a Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus.

Porque achámos que esta questão, de uma festividade religiosa se poder fazer em diferentes datas, merecia um esclarecimento, solicitámos a um nosso conterrâneo a sua colaboração.

O Fábio Bernardino tem 22 anos de idade. é filho de Pedro Bernardino (Casal) e de Maria Leonor Catarino e prepara-se para exercer a sua vocação de sacerdote da Igreja Católica. Actualmente e depois de ter estudado nos Seminários de Leiria e de Coimbra, reside no Seminário Maior de Cristo Rei dos Olivais e frequenta o 4.º ano do curso filosófico-teologógico na Universidade Católica de Lisboa  pelo que é, de entre nós, uma das pessoas melhor habilitadas para nos explicar estas mudanças no calendário dos festejos em honra de Nossa Senhora da Graça.

Agradecemos ao Fábio Bernardino a sua disponibilidade e é com muito prazer que agora publicamos o que escreveu a propósito:


A festa de Nossa Senhora da Graça, Padroeira da Ataíja de Cima, era então (em 1758) celebrada a 1 de Janeiro, dia em que, actualmente, toda a Igreja Católica vive a Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus.


Remontando ao século VI, esta Solenidade trata-se, com efeito, da mais antiga festa mariana da cristandade ocidental, que começou por celebrar, nesse dia, a dedicação da Basílica de Santa Maria Maior, em Roma, o mais antigo templo cristão dedicado à Virgem Maria e construído entre 432 e 440, durante o pontificado do Papa Sisto III (1).


Convocado pelo Imperador Teodósio II em 431, o Concílio de Éfeso proclamara a Virgem como “Mãe de Deus”, contra o herege Nestório, patriarca de Constantinopla, que negava a união, em Cristo, das naturezas divina e humana. Os duzentos bispos participantes reafirmaram convictamente que a Virgem Maria é Mãe de Deus, porque o único Jesus Cristo, seu Filho, sendo verdadeiramente homem, é também verdadeiro Deus. A Basílica lembra este título atribuído à Virgem, dado que ele salvaguarda uma verdade cristológica: a teologicamente designada de união hipostática(2).


Com o passar do tempo, o aparecimento de uma oitava para a Solenidade do Natal do Senhor levou a que neste dia, oito dias após o nascimento, se começasse a celebrar a seguinte etapa da vida do Menino, a circuncisão, assim como outras festas que foram aparecendo ao longo do tempo. Desapareceu então o cariz mariano do primeiro de Janeiro, tendo estado oculto durante séculos. Só em 1931, o Papa Pio XI, por ocasião do 15º centenário do concílio de Éfeso, instituiu a antiga festa mariana para 11 de Outubro.


Foi o Concílio Vaticano II que abriu as portas para que a Solenidade voltasse à sua data original. Em 1969, a Reforma do Calendário Litúrgico, pedida pelo Concílio, recuperou a antiga data de 1 de Janeiro, inserindo a celebração da maternidade divina de Maria, no tempo do Natal, a celebração do Mistério da Encarnação do Verbo de Deus, que lhe dá razão de ser.


Portanto, seguramente que em 1758, embora na Ataíja se celebrasse a 1 de Janeiro uma festividade mariana, tal não acontecia em toda a Igreja, que comemorava a Circuncisão. No entanto, dado que o calendário se ia enchendo de festividades devocionais próprias dos lugares(3), é possível que ocorressem outras festas em várias Igrejas particulares.


A meu ver, é pouco provável que a escolha desta data para a festa de Nossa Senhora da Graça esteja relacionada com a primitiva festa mariana celebrada no século VI, relativa ao título de Mãe de Deus. Todavia, acredito que terá, de facto, começado a ser realizada nesse dia, sendo depois transposta para o 2 de Fevereiro, dado que era, até há quarenta anos, o dia litúrgico da Purificação de Nossa Senhora, evocando-se a Senhora da Candelária(4). É talvez por isso que hoje, enquanto em numerosíssimos lugares se festeja Nossa Senhora da Candelária, das Candeias ou da Luz, o povo da Ataíja tem a sua festa em honra de Nossa Senhora da Graça. Embora os termos Luz e Graça possam ser teologicamente relacionados e até equacionados, não acho que a palavra graça fosse tida espontaneamente pelo povo como uma outra “variante” para exprimir luz ou candeia. Para além disso, não tenho conhecimento de nenhuma outra terra em que Nossa Senhora da Graça seja evocada no dia 2 de Fevereiro.


Parece que os antigos contavam que, aquando da construção da capela, os pedreiros carregaram uma grande pedra retirada de uns olivais próximos dali(5). Depois de colocada na construção já iniciada, a pedra voltava no dia seguinte a aparecer no sítio de onde tinha sido tirada. Como ninguém conseguia explicar o sucedido, retiraram parte dessa pedra com a qual esculpiram a imagem da Senhora da Graça, deixando o resto da pedra no olival, com a qual fizeram uma pia. Essa pia enchia-se com água da chuva que as pessoas bebiam e que nem no Verão se esgotava. Foi este facto que terá dado origem ao nome de Senhora da Graça, pois, por seu intermédio, Deus cumularia dos Seus dons o povo da Ataíja. Esses dons não podiam traduzir-se melhor para os ataijenses, que viviam dos produtos da terra, do que na abundância e qualidade das colheitas agrícolas, tão bem simbolizada no ramo que a imagem tem na mão direita. A procissão à serra, junto do cruzeiro, que ainda hoje se mantém, poderá ter este significado.


A data de 1 de Janeiro para a festa de Nossa Senhora da Graça, julgo que poderá relacionar-se com o início do ano. Se nela era pedido a Deus, por mediação da Virgem cheia de graça, que enviasse a Sua Graça sobre a vida das pessoas e muito particularmente sobre os campos, também se poderia pedir a Sua Graça para o ano da graça que nesse dia começava …(6)
No dia da inauguração das remodelações da Capela, em Dezembro de 2003, o pároco afirmou, julgo que por convicção pessoal, que a imagem de Nossa Senhora da Graça terá sido possivelmente esculpida no século XVI, por iniciativa dos Monges de Cister, e que a Capela terá sido construída por essa altura, sobre um antigo palheiro ali já existente…


Provavelmente, as razões da existência deste orago(7) permanecerão sempre envoltas em mistério, como de resto acontece em tantos locais de devoção mariana e não só. Existem as lendas que nos contam milagres… Neste caso, julgo que o melhor será mesmo apresentar, como principal razão, a história da relação de amor entre Deus que age gratuitamente e o Seu Povo que com gratidão Lhe responde. História na qual nem sempre tudo tem de ser compreensível aos nossos olhos…


Notas:
(1) A Liturgia cristã antiga dava especial destaque aos templos de Roma, nomeadamente àqueles em que o Papa celebrava ao menos uma vez por ano. Sendo assim, a memória da dedicação deste templo foi estendida a toda a Igreja, até uma certa altura.
(2) Do grego hipóstasis (natureza).
(3) Fenómeno que a Reforma Litúrgica pós Concílio Vaticano II muito travou, fazendo sobrepor as festividades universais às particulares.
(4) Ao contrário do que sucedeu com o 1 de Janeiro, o dia 2 de Fevereiro foi ganhando, ao longo dos tempos, uma grande marca da piedade mariana, convertendo-se assim em festa mariana. Inicialmente, este dia celebrava a Apresentação do Menino Jesus no Templo (em que também é purificada Maria), descrita em Lc 2, 22-39. Nesta passagem bíblica, acho que podemos encontrar o porquê de neste dia se evocar a Senhora da Luz, das Candeias: Semeão, homem justo e piedoso que vivia no Templo de Jerusalém, afirma ao ver o Menino, que Ele é a Luz para se revelar às nações e a glória de Israel (cfr. Lc 2, 32). A Reforma do Concílio Vaticano II “devolveu” o significado cristológico a esta Festa Litúrgica, tomando, a Apresentação do Menino, o primeiro lugar neste dia.
(5) Estes olivais localizar-se-iam onde hoje termina a Rua da Hortas.
(6) Note-se, neste parágrafo, a repetição do termo graça, que considero não ser meramente ocasional.
(7) Orago: Patrono, padroeiro (Invocação da Virgem, Santo ou Anjo) a quem é dedicada uma localidade, povoado ou templo.

Dezembro de 2010
Fábio Bernardino

12º ALMOÇO ANUAL DO SALÃO CULTURAL ATAÍJENSE

O 3.º DOMINGO DE JANEIRO É, SEMPRE, DIA DE ALMOÇO NO SALÃO!

Dia 16 de Janeiro de 2011, Domingo,  12º Almoço Anual do Salão Cultural Ataíjense!




terça-feira, 14 de dezembro de 2010

A indústria e o Comércio na Ataíja de Cima, hoje

Se, como referimos em post anterior (aqui), a importância económica da indústria da faiança é, hoje em dia, bem menor do que foi há vinte ou quinze anos atrás, em compensação as actividades ligadas à exploração da pedra Vidraço da Ataíja não têm parado de se desenvolver e alastraram-se, aliás, a todas as aldeias vizinhas. Agora já não é só, nem sobretudo, a actividade extractiva mas, antes, as da transformação e serviços associados.

Ao contrário do que aconteceu na cerâmica decorativa que é uma actividade importada e onde os ataíjenses quase nunca ultrapassaram a função de operários, no caso do Vidraço da Ataíja , verificou-se uma rápida adaptação que permitiu aos naturais aprender não só a extrair a pedra (a) como, mais importante em termos económicos, a transformá-la.

Por outro lado, as excelentes condições de acesso propiciadas pelo IC 2 (b) e a crescente importância da indústria extractiva regional, propiciada designadamente pelo desenvolvimento provocado pela crescente aceitação da pedra Molianos e outras extraídas nas Serras de Aire e Candeeiros, levaram alguns dos maiores grupos empresariais ligados à extracção e ao comércio de rochas ornamentais a instalar-se na Ataíja de Cima.

Esta dinâmica industrial levou a que as actividades, directa ou indirectamente ligadas viessem a, do mesmo modo, instalar-se ou desenvolver-se no local. Desde logo, a satisfação da necessidade básica da alimentação dos trabalhadores envolvidos, levou ao surgimento de cafés e restaurantes. A melhoria das condições de vida local, à banalização do automóvel e à necessidade de existência de oficinas de reparação. A produção industrial à necessidade de especialistas na sua comercialização. O crescimento do conhecimento local das técnicas de trabalhar a pedra ao surgimento de fábricas e oficinas de transformação.

Hoje, fazendo uma pesquisa sobre as empresas que têm fábricas, oficinas, armazéns ou outras instalações na Ataíja de Cima, contei 43 (c).

Mais de metade das empresas estão no sector da pedra, (extracção, serragem, armazenamento, fabrico de lareiras, pavimentos, revestimentos e cantarias, transporte, etc,).

Mais de 25% (12 empresas) possui sites próprios na internet. Este é um bom indício de que se trata de empresas modernas e viradas ao futuro.

O encerramento da maioria das fábricas de faianças conduziu, naquela época, ao surgimento de desemprego. Mas hoje em dia o desemprego é perfeitamente marginal (d) e, – parte boa – tendo desaparecido a exagerada pressão sobre a mão-de-obra local que levou a que uma geração inteira tivesse abandonado a escola para, (muito jovens, com catorze anos de idade), ir trabalhar nas fábricas há, finalmente, condições para a juventude estudar como deve estudar, já que só o estudo lhes poderá permitir fazer a gestão das empresas que os seus pais criaram, ou exercer, nelas, os cargos cada vez mais especializados que o futuro exige.

NOTAS:
a) -Nos primeiros tempos foi necessário recorrer à emigração de trabalhadores experientes, oriundos de Pero Pinheiro, Vila Viçosa, Ançã e Tentúgal (destes, cá ficou o Pimenta que, há muito tempo, já é um ataíjense).
b) Condições essas que, aquando da entrada ao serviço do IC 9, terão uma melhoria muito significativa.
c) Faltam algumas. A colaboração dos leitores para colmatar as falhas será bem-vinda.
d) A insuficiência da mão-de-obra local continua a justificar a existência de emigrantes, agora oriundos, sobretudo, dos chamados países de Leste.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

A Faiança na Ataíja de Cima

A rede pública de electricidade foi inaugurada na Ataíja de Cima, em Outubro de 1969, nas vésperas das eleições legislativa.

Estavam, assim, criadas as condições para o início de uma nova fase da industrialização da aldeia (industrialização essa que tinha começado em 1955 com o início da exploração do Vidraço de Ataíja, como se disse em post anterior).

Ainda em 1969, começou a ser construída a primeira fábrica de faianças, a SAFARIL – Cerâmica Artística e Decorativa dos Candeeiros, Lda, (cuja escritura publica de constituição da sociedade é de 1972) que tinha entre os sócios fundadores o ataíjense António Baptista Vigário.

Mais tarde, a Safaril integrou-se no grupo empresarial de faianças Martan/Safaril.

Fechou portas e apresentou-se à falência no ano de 2000, encontrando-se as suas instalações actualmente abandonadas.

Na década de 1980, assistiu-se a um grande crescimento do número de fábricas de faiança em todo o concelho de Alcobaça, tendo iniciado actividade um total de, pelo menos, 78 empresas, das quais 7 na Freguesia de São Vicente de Aljubarrota e, destas, 5 na Ataíja:

- Novalco – Novas Faianças de Alcobaça. Lda., a qual, tendo entrado em falência, foi adquirida por novos proprietários que a reabriram com a firma Destinos – Arte Cerâmica, S.A., e encontra-se em funcionamento.

- Carfip – Cerâmica da Figueira Pedral, Lda., que entretanto cessou as suas actividades e em cujas instalações existe, actualmente, uma fábrica de transformação de pedra da empresa Airemármores, Extracção de Mármores, Lda.

Sousicer – Faianças Decorativas. Lda., criada por iniciativa do ataíjense José Fernando Cordeiro de Sousa e que se encontra em laboração.

- Fata – Faianças da Ataíja, Lda., com falência decretada por sentença de 27-02-2003, do Tribunal da Comarca de Alcobaça.

- Sofal – Sociedade de Faianças. Lda., empresa que chegou a ter assinalável projecção. Veio a falir (insolvência declarada por sentença de 20-05-2008, do Tribunal da Comarca de Alcobaça), encontrando-se as suas instalações actualmente abandonadas e em rápido processo de deterioração.


As seis fábricas referidas empregavam, no final do Séc. XX, centenas de trabalhadores do que resultava o pleno emprego da população ataíjense e, por isso, embora o nível salarial fosse bastante baixo, próximo do salário mínimo nacional, esse foi um período de extraordinária prosperidade, tendo o nível de empregabilidade chegado a ultrapassar os 50% da população total da aldeia.


Actualmente, em todo o concelho de Alcobaça, são pouco mais de cinquenta as entidades que constituem o sector da cerâmica utilitária e decorativa, incluindo fábricas, fornecedores de matérias-primas, empresas distribuidoras e artesãos.

Uma vez que o sector se mantém em crise – e não se vê que possa voltar, ao menos em dimensão, ao que foi nos anos de 1980 – a maioria dessas entidades é constituída por “sobreviventes” do período áureo, o que se reflecte, desde logo, na idade média dos trabalhadores que é de cerca de 45 anos. Como sempre no sector, a maioria são mulheres (70%), têm como habilitações literárias a escolaridade mínima obrigatória e são operárias (88%).


NOTA: Este post é, parcialmente, subsidiário do estudo elaborado por Luís Peres Pereira para SDO Consultoria – Análise SWOT ao Sector da Cerâmica Utilitária e Decorativa da Região de Alcobaça – Relatório de Diagnóstico, Junho de 2009, disponível in:

http://www.cm-alcobaca.pt/resources/e948fa0cea16233e67612e1de606d708/Full_Report_Alcobaca_Final_Version_02.pdf

 
Bule "gata" produzido em 1992, na Ataíja de Cima, por SOFAL para a AVON (Estados Unidos)

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Vidraço de Ataíja

Na década de cinquenta do Séc. XX, julgo que, exactamente, em 1955, a Ataíja de Cima começou, pela mão de João Veneno, natural das Pedreiras, Porto de Mós, a entrar na modernidade.

Até aí a economia local era exclusivamente agrícola e o único produto importante, o único capaz de gerar excedentes monetários relevantes era, como já referido em posts anteriores, o azeite.

Nesse ano de 1955 o João Veneno, conhecedor das técnicas de extracção da pedra de “cantaria” que se explorava nas Pedreiras, face à perda de importância económica dessas explorações, decide começar a escavar na Ataíja de Cima a pedra local.

As primeiras escavações tiveram lugar no sítio dos Caramelos, no terreno onde José Henriques, recentemente falecido e que era conhecido por José Neto e, mais vulgarmente, por José Carago, veio depois a construir a sua casa. Mesmo junto ao local onde hoje existe uma pedreira da empresa Mármores Vigário. Lda.

Pouco tempo depois, em 1958, Luís da Graça de Sousa que todos conhecem por Luís da Graça e era leiteiro em Lisboa, decidiu regressar à aldeia e, algum tempo depois, começou a explorar pedra no sítio do Vale Cordeiro, num pequeno terreno que era propriedade de seu sogro, António Catarino.

Seguiram-se muitos outros e, até hoje, a importância económica da exploração (e posteriormente da transformação) da pedra que é conhecida por Vidraço de Ataíja ou ,simplesmente, Ataíja, não tem parado de crescer.

Mas essa é uma história para mais tarde. Por agora, fiquemo-nos pela caracterização do vidraço da Ataíja.

(O que abaixo se diz é inteiramente retirado, apenas com pequenas adaptações para permitir um texto corrido, de: ORNABASE – Base de Dados do Catálogo de Rochas Ornamentais Portuguesas, in
http://e-geo.ineti.pt/bds/ornabase/rocha.aspx?Id=59):


O vidraço da Ataíja é uma rocha calcária, finamente calciclástica, com tonalidade creme-acinzentada (o Ataíja Creme), ou cinzento e cinzento-azulado (o Ataíja Azul) que tem como utilizações recomendadas as cantarias e pavimentos e revestimentos, interiores e exteriores.

Explora-se em Ataíja de Cima, freguesia de São Vicente de Aljubarrota, município de Alcobaça, distrito de Leiria, em camadas integradas na formação Moleanos, datada do Caloviano Inferior a Médio (Jurássico Médio) e que apresenta grande continuidade no Maciço Calcário Estremenho (Orla Mezocenóica Ocidental) entre Alto da Serra e o paralelo de Porto de Mós.

Nas pedreiras que serviram para a caracterização das explorações e dos tipos litológicos, o Vidraço de Ataíja Creme ocorre conjuntamente com o Vidraço de Ataíja Azul. As bancadas têm atitude média, numa delas N30º E, 15º NW e na outra N3ºW E, 15º NW, por vezes são espessas, algo carsificadas e fracturadas, possibilitando, entretanto, a produção de blocos de dimensão média aceitável. Os principais sistemas de fracturação têm, em média, direcção N85º W, 85º N, N10º W, 65º E e N40º W, 80º E, este menos importante.

As placas são, em geral, obtidas por talhe ao “correr” da pedra.

As reservas são grandes e o acesso às pedreiras é bom.

Nas análises a que foram submetidas, não se notou qualquer alteração na cor nem na estrutura dos provetes no final dos 25 ciclos de gelo-degelo.




 Vidraço Ataíja Azul


Vidraço Ataíja Creme


segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A população da Ataíja de Cima em 1758

Em 1758, de acordo com o relatório do Pároco de São Vicente, elaborado nesse ano em resposta ao inquérito lançado por ordem do Marquês de Pombal e incluído nas chamadas Memórias Paroquiais, era a seguinte a população da Freguesia de São Vicente de Aljubarrota:





Note-se que nos casos de Aljubarrota e dos Moleanos se refere, apenas, a parte dessas localidades que pertencia à Freguesia de São Vicente, sendo que a parte dos Moleanos que pertencia a Nossa Senhora dos Prazeres, era muito maior, possuindo vinte e cinco vizinhos. No caso dos Chãos, o Pároco menciona, ainda, para além dos referidos trinta e quatro vizinhos, a existência de quatro nobres.

Admitindo que todos os dados estão correctos (e o pároco era, certamente, a pessoa que naquela época de melhores condições dispunha para um correcto recenseamento da população, já que possuía livros de assentos de baptismos, óbitos e róis de confessados e fazia visitas pascais recebendo as respectivas côngruas), não pode deixar de se referir os casos discrepantes dos Moleanos, com 6 pessoas por fogo, valor este muito superior à média e do Cadoiço que, a acreditar nestes números, teria várias casas com, apenas, um morador.

A Ataíja de Cima configurava-se, nesse tempo – há 252 anos atrás -, como a maior aldeia da freguesia, quer em número de fogos quer em população total, a grande distância dos Casais de Santa Teresa, a outra aldeia da freguesia que ultrapassava o número de 100 habitantes.

A freguesia, entretanto, mudou e surgiram as novas povoações de Mogo e Olheiros e os Moleanos mudaram de freguesia e não encontro notícia dos Casais dos Belos.

Confesso a minha ignorância, mas não conheço a região e a sua história tão bem como gostaria e, por isso, estes Casais dos Belos intrigam-me.
É que não consegui encontrar na internet outras referências a tal localidade que, como se vê, era no ano de 1758 de média dimensão no contexto da freguesia (20 vizinhos e 57 habitantes), salvo duas escrituras que se conservam no Arquivo Distrital de Leiria:
- Uma de 1794, referente a “ 50 000 reis que deu a juro Antónia Dionísio de Aguiar Barreto, recolhida no Mosteiro de Coz, a Manuel Francisco e mulher Marcelina Amada, dos Casais dos Belos, termo de Porto de Mós.”
-Outra de 1795, relativa a “25 000 reis que deu a juro o Mosteiro de Coz a Joaquim Lourenço e mulher Luisa da Costa, dos Casais dos Belos, Porto de Mós.”
- Uma terceira referência à mesma localidade encontrei-a em "Porto de Mós - Colectânea Histórica e Documental", do Prof. Saul António Gomes onde, (pág. 1069, Doc. 506) no Inventário dos Bens do Convento do Bom Jesus de Porto de Mós, 1843-1837, consta:
"Quarenta mil réis que deve Gregório dos Santos dos Cazaes dos Bellos por escriptura publica de doze de Março de mil oitocentos e trinta e hum ___ 40$000".
A págs. 1071 do mesmo livro, refere-se a dívida dos juros correspondentes:
"Deve mais Gregorio dos Santos dos Cazaes dos Bellos proveniente de reditos a quantia de dois mil reis ___ 2$000".

Em toda a demais literatura sobre a região que até agora consultei, não me lembro de ter lido qualquer outra referência aos Casais dos Belos

Assim, desde já agradeço aos eventuais leitores que, em comentário ou por email, me resolvam esta dúvida: onde eram os Casais dos Belos?

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A Ataíja de Cima e Porto de Mós – Séc. XVI e XVII

A dependência secular da freguesia de São Vicente de Aljubarrota e, assim, da Ataíja de Cima, das igrejas de Porto de Mós e, através destas, da Colegiada de Ourém (e não do Mosteiro de Alcobaça, como muitos parecem acreditar) é abundantemente comprovada por muitos documentos.

Hoje, recorrendo uma vez mais ao monumental livro “Porto de Mós – Colectânea Histórica e Documental, Séculos XII a XIX”, do professor Saul António Gomes, editado em 2005 pelo Município de Porto de Mós, no âmbito das comemorações dos 700 anos do foral da Vila dado em 1305, mencionaremos três desses documentos:

No Registo das receitas e despesas da Colegiada de Santa Maria da Misericórdia de Ourém relativas ao ano económico de 1559-1560, elaborado em Ourém em 9 de Janeiro de 1562 (in op.cit., pág. 720, Doc. 414), aparece a seguinte rubrica:

“Item pagou ao dito Joam Afonso pera gastos das Igrejas de Porto de Mos e Aljubarrota, seis mill reais dos quães gastos e despesas o Senhor Prior tomou conta em Porto de Mos aos Priostes de que Joam Afonso prioste tem papes ___ bj¯ reais.”

No Registo das receitas e despesas da Colegiada de Santa Maria da Misericórdia de Ourém relativas ao ano económico de 1572-1573, elaborado em Ourém em Junho de 1573 (in op.cit , pág. 738, Doc. 419), de novo, surgem despesas com a Igreja de Aljubarrota:

“Item pagou pera gastos na Igreja de S. Vicente da Aljubarrota ___ j¯ vc reais.”

O terceiro documento, também transcrito na obra citada (pág. 779, Doc 436), é datado de Leiria, 29 de Outubro de 1627 e contém o traslado do: “Contrato e sua ratificação pelo Bispo de Leiria, através do seu Provisor no Bispado, Pe. Francisco Vieira, do termo estabelecido entre a Colegiada de Santa Maria de Ourém e as Igrejas de Santa Maria (Nossa Senhora dos Mortinhos), São João e (São) Pedro de Porto de Mós, acerca da colecta das rendas das Freguesias que lhe eram anexas naquele concelho e sua aplicação”, do qual consta:

“… e ahi todos juntos e cada hum por si por parte das suas Igrejas, de transausão e amigavel composisão por excuzarem dovidas e demandas na maneira seguinte:
Nos depozitos que estão escritos nos Livros da Recepta e Despeza das tres Igrejas e anexas desta Villa de Porto de Mos em que elles todos são partes imteressantes não queriam que se uzasse mais dos ditos livros nem contas senão somemte cobrar o dinheiro que deve Belchior Antunes como erdeiro e testamenteiro de Bras Luis beneficiado que foi na See de Leiria, E que se fizesse deligencia por hum Livro que la esta e achando se elle e constando dever se algum dinheiro a este depozito se partira de mão comum por estas Igrejas que fica dos ditos depozitos para a Fabrica e obras delas e das anexas do dinherio que esta cobrado e se deve he se comsertaram as anexas a saber Alvardos e Aljibarrota e Serra Ventozo e o remanesemte ficara pera se gastar na Igreja de São João desta villa de Porto de Mos. …”


NOTAS:
(1) Prioste – Recebedor das rendas da Igreja (Dicionário Priberam da Lingua Portuguesa, in http://www.priberam.pt/DLPO/).
(2) No segundo Doc. referido, o valor (mil e quinhentos reais) está, efectivamente, escrito em formato que não conseguimos reproduzir no texto. Assim:

Sobre numeração romana pode ver-se: "O sistema romano de numeração", por J. F. Porto da Silveira - Mat/UFRGS, ampliado e ilustrado por Iran Carlos Stalliviere Corrêa - IG/UFRGS, in http://www.mat.ufrgs.br/~portosil/histo2e.html

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

O azeite na Ataíja de Cima, cerca de 1950

Durante mais de dois séculos e até há menos de 50 anos atrás, a produção de azeite foi a actividade económica mais importante na Ataíja de Cima e em toda a região.

Os grandes olivais foram no entanto, quase todos, durante muito tempo, propriedade de não residentes. Em 1950 ainda assim era com, entre outros, o olival do Mira e o olival do Sá. Grandes produtores locais de azeite eram os donos dos lagares: Luísa Ribeiro, José Ribeiro e Francisco dos Casais que herdara parte do olival dos frades e poucos mais.

A generalidade das famílias possuía pequenos olivais, muitas vezes, pés de oliveira isolados e os mais pobres ocupavam-se, no final da apanha, no “rabisco” seja, a catar das oliveiras alheias os bagos que ficavam após a apanha, fosse na árvore fosse no chão para, com isso, juntarem mais uns quantos litros de azeite à magra colheita familiar.

O azeite era, em geral, de muito má qualidade, em razão dos processos arcaicos em uso: As oliveiras, quando o terreno se não encontrava já limpo pelas lavouras das culturas de inverno, eram “enterreiradas”, o que consistia em raspar cuidadosamente o terreno para o libertar de ervas (trabalho que se fazia logo em Setembro ou no inicio de Outubro, após as vindimas) e sobre esse terreiro iam caindo as azeitonas mais fracas e doentes, gafadas ou picadas da mosca e também, no dia da colheita caiam todas as varejadas que era esse o processo corrente de apanha, sendo raro o recurso ao ripanço, por mais moroso e, assim, mais caro.

A apanha propriamente dita fazia-se do chão do terreiro, aproveitando-se tudo: as azeitonas sãs que tinham acabado de ser varejadas e todas as que se encontravam na terra, às vezes há mais de um mês.

Seguia-se o entulhamento, muitas vezes em casa do proprietário, por insuficiência de tulhas nos lagares e ali ficavam as azeitonas, deficientemente limpas de folhas e sujas de terra, salgadas para retardar e fermentação e o apodrecimento, a aguardar a sua vez de serem moídas e transformadas em azeite.

Hoje sabe-se que, idealmente, as azeitonas devem ser desfeitas até 24 horas após serem colhidas, sem prejuízo de estarem disponíveis no mercado sacos plásticos, certificados para uso em produtos alimentares onde, quando bem fechados, com o mínimo possível de ar e não empilhados e estando as azeitonas sãs, enxutas e limpas, se conservam em bom estado por alguns dias.

Com os métodos do enterreiramento e entulhamento fazia-se tudo ao contrário e, quando chegava a altura da moenda, as azeitonas eram, frequentemente, uma massa quase informe e malcheirosa de que resultavam azeites de muito má qualidade.

Era assim por todo o lado e só isso justifica que, em 1950, o proprietário de uma quinta em Camarate (arredores de Lisboa) se mostrasse interessado em adquirir azeite na nossa região.

Numa carta de 16 de Dezembro de 1950, enviada a José Coelho, o seu amigo Joaquim Pio (da Ataíja de Baixo) dá conta desse interesse e das condições para o negócio:

 Nesse ano de 1950 a colheita de azeite terá sido, como de costume, abundante na Ataíja. À qualidade, designadamente à acidez, todos hoje torceríamos um pouco o nariz. Os métodos que então se usavam não permitiam, no entanto, melhor qualidade: O bom azeite tinha 3,1 graus de acidez, o corrente 6 ou 7 graus. E contam-me que, nesse tempo, se chegava a fazer azeite com 12 e 13 graus.

Em 9 de Dezembro de 1951 (na colheita seguinte àquela a que se refere a carta acima reproduzida), Joaquina Rosalia (mulher do José Coelho atrás referido) escreve a seu marido dizendo que o azeite se está a vender a “200$00 e mais, é conforme o grau” (este preço refere-se ao almude - 20 litros) e, numa carta anterior, de 25 de Novembro, dava conta que os homens estavam a ganhar 27$00 e as mulheres 15$00 e fornece outros elementos interessantes: que uma medura de 24 sacos deu 97 litros de azeite “livres” (quer dizer, após o lagar ter cobrado a respectiva maquia) e que vendeu o bagaço por 75$00.

Veja-se o valor do bagaço que, naquele tempo, salgado e depositado em pequenos poços a que chamávamos “covas do bagaço”, se aproveitava para alimentar porcos.

Em 31 de Março de 1952, o José Coelho há-de escrever a sua mulher dando-lhe ordem para vender algum azeite “mas só se te derem a 205$00 ou a 210$00”.

Hoje é possível comprar um bom azeite por menos de € 5,00 o litro. Ora, como vemos, naquele tempo a jorna de um homem dava para comprar apenas 2,7 litros de azeite e a de uma mulher para, apenas, 1,5 litros. O correspondente, hoje, respectivamente, a € 13,50 e € 7,50.

E, no entanto, esses eram valores de remuneração relativamente atraentes para os nossos pais e avós. Tanto que, na mesma carta, de 25 de Novembro, a Joaquina Rosalia diz a seu marido, certamente em resposta a um pedido para encontrar na Ataíja de Cima uma rapariga que estivesse interessada em ir para Lisboa como criada de servir: “José, quanto a criada, agora não se arranja por cá nenhuma porque agora há cá boa jorna e ninguém quer ir servir”.

2010, Novembro: O lagar de Francisco Vigário, o único actualmente existente naAtaíja de Cima

domingo, 26 de setembro de 2010

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Festival das Sopas


Ontem, dia 5 de Setembro, no Largo do Cabouqueiro, com o magestoso cenário da Serra dos Candeeiros em fundo e a par das ruínas da Casa do Monge Lagareiro, gozando um dia maravilhoso à sombra das jovens mas já frondosas árvores, mais de quinhentos ataijenses e amigos, participaram no Festival das Sopas, uma iniciativa da Comissão do Carnaval da Ataíja, com o objectivo da angariar fundos para a organização do Carnaval de 2011.


Sopa castanha, sopa de peixe, massada de bacalhau, sopa de abóbora, sopa de pedra, misturadas de chícharos, canja, misturadas, sopa de legumes, caldo verde (e acho que me esqueci de algumas), tudo fruto de trabalho voluntário, complementadas com sardinhas escaladas e assadas, febras grelhadas e caracóis, fizeram as delícias dos presentes que não arrancaram pé até depois das 20H00. As sobremesas, essas adquiriam-se numa banca cujos proveitos revertem a favor da APEJAC -Associação de Pais, Escola e Jardim de Infância da Ataíja de Cima (http://centroescolarataija.blogspot.com/) e vão ser aplicadas no SAF (Serviço de Apoio à Família) da Escola e Jardim de Infãncia da Ataíja de Cima.


Misturadas de Chícharos


Sopa de Peixe


Caldo Verde


Canja


Sopa de Abóbora


Misturadas

Cronologia dos acontecimentos:

13H28 - Abertura das hostilidades


14H19 - em pleno ataque às sopas


18H07 - À mesa, na sombra, num dia de Verão. Nada melhor para pôr a conversa em dia.

18H30 - Um pézinho de dança para ajudar a digestão


19H34 - O convívio continua


20H16 - Tem de ser ... o dia está muito bom, a Serra dos Candeeiros é muito bonita mas ... comecem a levantar-se das mesas que amanhã é dia de trabalho e hoje ainda há muito que fazer, muita coisa para arrumar e limpar.


A Comissão organizadora do Carnaval da Ataíja de Cima, está de parabéns, pela impecável organização, onde nem sequer faltou um parque infantil insuflável. A ela e aos muitos voluntários cujo trabalho propiciou o grande êxito que foi este evento, os nossos agradecimentos.

Até para o ano, para mais um Festival das Sopas da Ataíja de Cima.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Artistas Ataijenses - Inês Neves

O Verão de 2010 tem sido de intensa actividade para Inês Neves que, depois de ter apresentado no passado mês de Julho, no salão da Adega Cooperativa de Alcobaça uma magnifica exposição onde, além de outros trabalhos, mostrou aguarelas representando todos os edifícios religiosos do concelho de Alcobaça, voltou a expôr alguns desses trabalhos no âmbito da Aljubarrota Medieval.

Continuando a mostrar o meritório trabalho que vem realizando, de inventariação e divulgação do património religioso da nossa região, teremos brevemente mais duas exposições de aguarelas de Inês Neves:

Na galeria do Posto de Turismo da Nazaré de 3 a 30 de Setembro e com o patrocínio da Cãmara Municipal da Nazaré, todas as igrejas e capelas do respectivo concelho, como sempre, em aguarelas de grande qualidade técnica e valor iconográfico, como se pode  adivinhar do cartaz representando o Santuário de Nossa Senhora da Nazaré que abaixo se reproduz:



Também na Batalha, na galeria municipal Mouzinho de Albuquerque, no edifício Mouzinho de Albuquerque que já foi a sede da Cãmara Municipal da Batalha e onde hoje funcionam, além da Galeria, o Arquivo Municipal e diversas organizações com destaque para o CPAE - Centro do Património da Alta Estremadura, poderá o público apreciar, entre 11 e 26 de Setembro, as aguarelas de Inês Neves que representam a totalidade do património religioso do respectivo concelho.
Mais uma vez, o cartaz da exposição exemplifica a qualidade do trabalho de Inês Neves:



Para saber mais sobre o trabalho de Inês Neves:

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Da estrada do Diamantino ao IC9

Na “fronteira” entre a Ataíja de Cima e os Casais de Santa Teresa erguia-se, em meados do Séc. XX, o lagar de azeite conhecido localmente por lagar do Diamantino, por ter sido mandado construir e ser propriedade do comerciante alcobacense Diamantino dos Santos Vazão. O lagar foi desactivado já há algumas décadas e aí funciona, actualmente, uma oficina de serralharia e tornearia.

Para facilitar o acesso ao lagar, mandou o Diamantino construir um caminho desde o Largo do Outeiro, pela Rua das Seixeiras e, a partir daí, para nascente, até ao lagar no que foi, talvez e excluindo, naturalmente, a estrada de D. Maria Pia, a primeira estrada pavimentada existente por estes lados.

Da qualidade do trabalho então realizado diz bem o troço onde ainda é visível o pavimento inicial, entre a Rua das Seixeiras e o prolongamento da Rua das Hortas, o qual se mantém em muito bom estado de conservação, conforme se pode ver na fotografia seguinte, tirada em 15-08-2010:


 (Estrada do Diamantino)

Muito perto da Estrada do Diamantino estão agora em curso as obras de construção do IC9 que ligará a Nazaré a Tomar.

Desta estrada está já aberto à circulação automóvel o trecho entre Tomar (IC3) e Carregueiros, numa extensão de 8.350 metros, inaugurado em 30-03-2008 e encontra-se praticamente concluído o troço entre Carregueiros e Vale dos Ovos.

Quando estiver totalmente em funcionamento, o IC9, mudará profundamente o sistema de acessibilidades da nossa região uma vez que, cruzando a A8, o IC2 e a A1 e as linhas ferroviárias do Oeste e do Norte, facilitará extraordinariamente as ligações às principais vias de comunicação do nosso país, à Beira Interior e ao Norte Alentejano.

Espera-se, pois, que o IC9 venha a ter um importante impacte económico na nossa região, inclusive na área do turismo e do lazer, quer por facilitar o acesso ao litoral das populações do interior quer, sobretudo, por ligar três monumentos que fazem parte da lista do património mundial da UNESCO: Os Mosteiros de Alcobaça e da Batalha e o Convento de Cristo de Tomar e, ainda, o Santuário de Fátima.


(obras do IC9, junto à estrada entre Ataíja de Cima e os Casais de Santa Teresa, vendo-se Aljubarrota ao fundo. Foto tirada em 15.8.2010)

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Serra dos Candeeiros

Dissemos no post anterior que o nome de serra dos Candeeiros para designar a serra fronteira à Ataíja de Cima, é um nome recente.

É o que se pode ver em “ CHOROGRAPHIA MODERNA / DO / REINO DE PORTUGAL / POR / JOÃ0 MARIA BAPTISTA / CORONEL DE ARTILHERIA REFORMADO / COADJUVADO POR SEU FILHO / JOÃO JUSTINO BAPTISTA DE OLIVEIRA / OBRA PREMIADA NO CONGRESSO INTERNACIONAL DE GEOGRAPHIA E ESTATÍSTICA / REUNIDO EM PARIS EM 1875 / VOLUME IV / LISBOA / TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS / 1876” (o exemplar consultado pertence à Biblioteca da Universidade de Toronto, Canadá e encontra-se disponível na Internet em http://www.archive.org/details/chorographiamode04baptuoft)

onde, ao descrever a situação geográfica das diversas localidades que se situam nas abas da serra dos Candeeiros (e também na serra de Aire) se usam as mais diversas denominações para identificar essas serras e, quando se refere a serra dos Candeeiros (nos casos de Alcobertas, Arrimal e Turquel), considera este nome, apenas, uma alternativa.

(transcrevemos apenas a parte do texto que se refere à localização das povoações)

ALCANEDE - Está situada junto das serras de Alcanede e Mendiga.
ALCOBERTAS - Está situado o lugar das Alcobertas em valle, na serra das Alcobertas ou dos Candieiros.
ALJUBARROTA - Está situada na estrada real de Leiria para as Caldas da Rainha, na aba da serra de Porto de Moz para a parte do poente.
ALQUEIDÃO DA SERRA (CONCELHO DE TORRES NOVAS) - Está situado o lugar de Alqueidão na aba da serra d'Aire.
ARRIMAL - Está situado o lugar de Arrimal em campina, entre as serras de Figueira ou dos Candieiros e de Pias.
MENDIGA - Está situado o Lugar da Mendiga na aba da serra da Mendiga, na estrada de Porto de Moz para Torres Novas.
MIRA – (Mira de Aire) Está situado o Lugar de Mira na aba da serra d'Azambuja (ramificação da serra d'Aire).
PORTO DE MOZ - Está situado em um recosto na aba da serra do Alqueidão, na margem esquerda do rio Lena.
SERRO VENTOSO - Está situado o Lugar de Serro Ventoso entre as serras de Carvalho e dos Penedos Negros (ramificações da grande serrania de Minde) em alta portella mui ventosa.
TURQUEL - Está situada na aba da serra dos Molianos ou dos Candieiros pela parte do poente.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Serra dos Candeeiros

O nome de Serra dos Candeeiros, por que hoje conhecemos a serra fronteira à Ataíja de Cima, é muito recente e não o encontramos em quaisquer documentos antigos. Mesmo no Séc. XIX, era, ainda, a serra chamada frequentemente por diversos nomes, como serra dos Molianos, serra de Rio Maior, serra de Porto de Mós, serra das Ataíjas, etc.

No caso do Relatório de 1758, do pároco de Nossa Senhora dos Prazeres, elaborado a mando do Marquês de Pombal e a que já fizemos referência no post de 29-5-2010 "Quando a festa de Nossa Senhora da Graça se celebrava no dia 1 de Janeiro", a serra dos Candeeiros é chamada "Serra das Taíjas"

Transcrevemos a Parte Segunda do referido relatório (as reticências referem-se a pequenas partes do texto que não conseguimos decifrar), onde se faz uma interessante, pormenorizada e, certamente, bem informada descrição do que era, naquele tempo, a parte da serra dos Candeeiros que pertencia ao termo de Aljubarrota:

Parte segunda

Em a qual se responde aos seus interrogatórios e se da verídica informaçaõ, e noticia da Sérra das Taijas
1 Em distancia de huma legoa da Villa de Aljubarrota pêra a parte do Sul esta huma fragoza, e alta Sérra a qual tem por nome a Sérra das Taijas, e tem o seu assento em lugar tam decuberto e desafrontado que do pé da Praça de Badajós em distancia de quarenta legoas se logra claramente a sua vista.
2 Esta Sérra tem dés legoas de comprimento e quasi meya legoa de largo, e tem o seu principio junto á Villa de Portodemos, donde discorrendo via recta pela parte do Sul, no fim dellas junto ao Lugar de Riomayor … e logo mais adiante em pouca distancia se torna a levantar e continuando mais tres legoas vai finalmente acabar ao pé da Serra de Montejunto.
3 Esta Sérra não tem braço algum antes é reunião de muytos que assim ella como a serra de Minde, a de Alvados, e outras mais, que com ela são braços da Sérra da Estrela.
4 No districto e termo da Villa de Aljubarrota naõ nasce Rio algum.
5 Dentro do termo da Villa de Aljubarrota naõ há no districto desta Sérra nem Villas, nem Lugares, porém no mesmo termo ao longo desta estaõ os lugares de Taija de baixo, o Lugar de Taija de Sima, o Lugar dos Casais de Santa Tereza, o Lugar do Casal do Rey, o Lugar dos Covoeñs, o Lugar porem das pedreiras esta situado nas raizes della.

6 No districto desta Sérra dentro no termo desta Villa de Aljubarrota naõ há fonte de qualidade alguma.
7 Dentro do termo da Villa de Aljubarrota não há nem nunca em tempo algum se descobrio nesta Sérra mina alguma de metaes; porem há nella immensidade de excelentes cantarias de pedra branca molar, de que se tem feito admiráveis e sumptuosos edifícios assim antigos, como modernos.
8 Esta Sérra he povoada de muyto rosmaninho, pimenteira, e alecrim, e nella naõ há outras ervas medicinais, nem se cultiva em parte alguma, nem produz género algum de fructos, nas raízes porem della se admira uma dilatada planície de mays de tres legoas de comprimento, e um quarto de largo, a qual toda se cultiva, e he plantada de fecundíssimos olivais, cujo arvoredo a faz muyto vistoza e aprazível.
9 Nesta Sérra naõ há Mosteiros, Igrejas de Romagem, nem Imageñs milagrosas.
10 Há nesta Serra criaçoeñs de gados, e bastante caça de Coelhos, Lebres, perdizes, pombos bravos; e principalmente de lobos, e Rapozas he muyto asssistida e vizitada; sem que sejam bastantes pera os extinguir, as muitas montarias que lhes fazem.
11 Nesta Sérra esta um Arco de Cantaria chamado o Arco da Memoria em cujo lugar, se diz, que o Senhor Rey Dom Affonso Henriques fizera voto de dar á Ordem Cisterciense tudo o que desse lugar avistasse athé ao Mar pela occasião da expugnação da Villa de Santarem como consta de hum padraõ que está no mesmo arco com a inscripçaõ seguinte
Hic scalabim expugnaturus Alfonsus … Portugalia Rex votum vo.. Christo daturum se Ordini Cister ..ensi cincta qua oculus cernere po… decurrentibus aquis in mare, st maritis Divi patris Bernardi fretus verbem capissete Quod dum Pater Sanctus suis st orumque orationibus obtinet, Rex promissa adimplet Surgit Alcobatiae Regale cenobium cujus Principatus ic in ora marítimo terminum habet Gesta sunt hoc omnia anno Domini MCXLVII …

Notas: Voltaremos a falar deste texto. Por agora, quero chamar a atenção dos leitores para duas coisas:
- Quando, no ponto 5, se fala do Lugar das pedreiras, não se está a referir as Pedreiras que pertecem ao conselho de Porto de Mós mas, antes, os Molianos. De facto os Molianos eram conhecidos por a Pedreira, ou a Pedreira dos Molianos e ainda quando eu era pequeno assim lhe chamava a generalidade das pessoas mais velhas.
- Outro ponto interessante do texto é a prova de que já em meados do Séc. XVIII, portanto antes da construção do lagar dos Frades da Ataíja de Cima e da plantação do Olival do Santíssimo (o olival dos frades da Ataíja de Cima) já toda a nossa região era largamente povoada de oliveiras.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Ataíja de Cima e a Diocese de Leiria

A Diocese de Leiria foi criada, a pedido de D. João III, pelo Papa Paulo III em 22 de Maio de 1545 e ampliada em 1585, com a integração das paróquias de São Vicente de Aljubarrota, Alvados, Arrimal, Seiça, Fátima, Freixianda, Juncal, Mendiga, Minde, Olival, Ourém, Porto de Mós (São João, São Pedro e Santa Maria) e Serro Ventoso.

Como se diz no COUSEIRO:
“No ano de 1585, uniu o Sumo Pontífice (Sisto V) a este bispado a vila de Ourém e seu distrito, que teve somente efeito na jurisdição, da qual se tomou posse pelo bispo D. Pedro, em 14 de Junho de 1586”. Na mesma data, foram integradas a vila e termo de Porto de Mós, com suas paróquias, e “metade da vila de Aljubarrota, que era a freguesia de S. Vicente, que veio juntamente nesta união, assim renda para o cabido, como jurisdição para o Prelado”. Todos estes territórios pertenciam ao arcediagado de Santarém e ao arcebispado de Lisboa.

Nessa época, já estavam constituídas as seguintes paróquias, algumas fundadas desde o primeiro povoamento cristão, e outras ao longo dos tempos, até esse ano de 1586: na vila de Ourém, Santa Maria, S. Tiago, S. Pedro e S. João; no seu termo, as da Freixianda (séc. XIII?), Seiça (1517), Olival (séc. XIII?) e Fátima (1568); na vila de Porto de Mós, S. Pedro, S. João e Santa Maria; no termo, as paróquias de Minde (cerca de 1555), Alvados (entre 1555 e 1559), Arrimal (depois de 1526), Mendiga (depois de 1526), Serro Ventoso, Juncal (1554?) e S. Vicente de Aljubarrota (antes de 1429).

No início do Séc. XVII (1606), sendo bispo D. Martim Afonso Mexia (1604-1615), procedeu-se, sob a direcção do arquitecto Pêro Moreira, à reconstrução da igreja de São Vicente de Aljubarrota.

Em 9 de Outubro de 1614, o Papa Paulo V, pela bula “Decet Romanum Pontificem”, integrou no bispado de Leiria as paróquias de Nossa Senhora dos Prazeres de Aljubarrota e de Alpedriz, até então pertencentes ao arcebispado de Lisboa.

A Diocese veio a ser extinta em 30 de Setembro de 1881, por bula de Leão XIII, tendo uma parte das paróquias sido integrada na Diocese de Coimbra e as restantes 25 no patriarcado de Lisboa: quatro paróquias do actual município de Alcobaça (Nossa Senhora dos Prazeres e S. Vicente de Aljubarrota, Alpedriz e Pataias); duas da Batalha (Batalha e Reguengo do Fetal); onze de Porto de Mós (Alcaria, Alvados, Alqueidão da Serra, Arrimal, Juncal, Mendiga, Minde, Mira, Porto de Mós [S. João e S. Pedro] e Serro Ventoso); oito de Ourém (Espite, Fátima, Freixianda, Olival, Ourém, Rio de Couros, Seiça e Vila Nova de Ourém).

Em 17 de Janeiro de 1918, o Papa Bento XV, restaurou a Diocese e, em 25 de Março de 1957, a sua área foi de novo aumentada com a integração da freguesia de Formigais, desanexada do patriarcado de Lisboa.

A partir da refundação, sob o governo do Bispo D. José Alves Pereira da Silva e devido ao fenómeno de Fátima que, aliás, levou à alteração da sua designação para Diocese de Leiria-Fátima, atribuída por bula de João Paulo II, de 13 de Maio de 1984, a Diocese de Leiria acabou por se transformar numa das mais importantes dioceses portuguesas e é composta por nove vigararias: Batalha – na qual se integram as paróquias de Alpedriz, Batalha, Calvaria, Juncal, Reguengo do Fetal e Nossa Senhora dos Prazeres e São Vicente de Aljubarrota -, Colmeias, Fátima, Leiria, Marinha Grande, Milagres, Monte Real, Ourém e Porto de Mós.

A Ataíja de Cima integra, assim, a Diocese de Leiria desde 1585.

NOTA: Na elaboração deste texto recorremos às seguintes fontes de informação:
- O Couseiro, ou memórias do bispado de Leiria;
- A Diocese de Leiria-Fátima, por Luciano Coelho Cristino, in Catedral de Leiria;
- Diocese de Leiria-Fátima, por Saul António Gomes, In Dicionário de História Religiosa de Portugal, Vol. 3, Círculo de Leitores, Lisboa 2001;
- http://www.leiria-fatima.pt/

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Festa em Honra de Santo António

No dia 15 de Agosto vai decorrer na Ataíja de Cima a tradicional Festa em Honra de Santo António.
Integrada no Programa da Festa, este ano e pela primeira vez, disputar-se-à no sábado dia 14-08-2010 e com início às 18h00 a



Mais informações sobre esta prova podem ser obtidas em http://festadesantoantonio2010.blogspot.com/ ou, ainda, pelo email paulino.axa@iol.pt ou pelo número de telemóvel 919742883.

NOTA: O curioso nome de "Santo António Serôdio"que a organização resolveu dar à corrida  deve-se, sem dúvida, ao facto de, como referimos em post anterior, Santo António ser habitualmente comemorado no dia 13 de Junho, data da sua morte, enquanto na Ataíja de Cima é comemorado em 15 de Agosto, data do seu nascimento. O que faz da Festa de Santo António da Ataíja de Cima uma festa serôdia, quer dizer, tardia.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Santo António na Ataíja de Cima

Na capela de Nossa Senhora da Graça da Ataíja de Cima, sobre duas peanhas de pedra cravadas na parede que ladeiam o nicho onde se encontra a imagem do orago, estão, dentro de redomas de vidro, as imagens do menino Jesus e de Santo António.
Trata-se de imagens modernas, adquiridas já na segunda metade do Séc. XX, para substituir outras mais antigas que se encontravam muito deterioradas e, pelo menos o menino Jesus, das últimas vezes que saiu em procissão tinha, inclusive um dos braços partidos.
Inicialmente e até ao Séc. XVII, na capela havia, ao menos a acreditar no autor do COUSEIRO, apenas a imagem de Nossa Senhora da Graça. Entre meados do Séc. XVII e meados do Séc. XVIII, foi acrescentada a imagem do menino Jesus, uma vez que no seu relatório de 1758 o cura de São Vicente diz que ela está sobre o altar, sem fazer qualquer referência a Santo António.

A introdução da imagem de Santo António é, pois, posterior e, em data que não conhecemos, passou a realizar-se uma festa em honra do Santo no dia 15 de Agosto.

Ora, Santo António é tradicionalmente festejado, em 13 de Junho. Qual, então, a justificação para que na Ataíja seja celebrado em 15 de Agosto?
É que Santo António nasceu em Lisboa, onde foi baptizado com o nome de Fernando de Bulhões, em 15 de Agosto de 1191 (ou 1195, não se sabe bem), e faleceu em Pádua em 13 de Junho de 1231. O que comemoramos é, assim, a data de nascimento do santo.

Santo António foi frade agostiniano mas, em 1220, ingressou na OFM (Ordem dos Frades Menores, Franciscanos) de cujo Capítulo Geral, em Assis, Itália, fez parte por convite do próprio São Francisco.
Foi canonizado pelo Papa Gregório IX no dia 30 de Maio de 1232, menos de um ano após a sua morte, o que diz bem do prestígio de santo que adquiriu em vida.
Em 1946, o papa Pio XII proclamou-o Doutor da Igreja, considerando que foi um exímio teólogo e insigne mestre em matérias de ascética e mística.

"Assentou praça" em 1668 e foi sucessivamente promovido a capitão, e a Tenente-Coronel do Exército Português, com direito ao respectivo soldo e o mesmo aconteceu no Brasil durante todo o período imperial, com a patente de Tenente-Coronel e direito ao soldo que só deixou de ser pago em 1911.

Santo muito popular em países como Portugal, Itália, Brasil e Espanha (onde, em Ciudad Real, o vi festejar rijamente) tornou-se, em detrimento de São Vicente, o patrono popular de Lisboa que o comemora com sardinhas assadas na noite mais alegre, movimentada e anárquica do ano. É santo casamenteiro, advogado de causas perdidas e afamado milagreiro (no Brasil fazem promessas e colocam a imagem de cabeça para baixo até que se cumpram).

Como é que um místico e asceta Doutor da Igreja se torna um santo tão popular, sempre associado na imaginação do povo a festa e alegria? Não sei mas, a verdade é que todos os franciscanos que conheci eram pessoas alegres, bem dispostas e com gosto de viver. Talvez Santo António fosse um franciscano assim.


FESTA EM HONRA DE SANTO ANTÓNIO

ATAÍJA DE CIMA

15 DE AGOSTO DE 2010

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Pedra insonsa

Os estudiosos que têm publicado sobre a região serrana do concelho de Alcobaça dão, sistematicamente, uma grande importância às construções em pedra seca ou insonsa, quer dizer, sem qualquer argamassa.
Mas, se esse tipo de construção é evidente nas delimitações das propriedades, em paredes de estrutura muito simples, a maioria das vezes mera sobreposição das pedras, solução aliás comum em muitas regiões de Portugal (por exemplo, nas zonas rurais do concelho de Sintra) e, também noutros países da área mediterrânica, como se vê na fotografia seguinte tirada na Croácia mas que bem o poderia ter sido no vale da ribeira do Mogo:



A verdade é que na Ataíja o uso desta técnica foi muito limitado no que respeita à construção de edifícios e outras estruturas mais complexas. Pelo menos nos últimos dois séculos, é de crer que o exemplo dos frades que construíram o lagar dos frades com uma argamassa de barro, cal e borras de azeite, tenha sido largamente copiado. Os muros da "quinta", são, aliás, um extraordinário exemplo da qualidade desta construção, mantendo, após duzentos e cinquenta anos, uma notável solidez, como se vê da fotografia seguinte:



Esse uso limitado da técnica de construção em pedra insonsa é bem compreensível desde logo, porque é claramente mais fácil construir com argamassa com o que se dispensa (à custa, até certo ponto, da solidez do conjunto) um aparelhamento mais minucioso das pedras de enchimento.
Havia, construidas em pedra seca, muitas cortes de porcos, covas de bagaço e pequenos palheiros ou casas de arrumos mas estão hoje quase todas desaparecidas.
Os poços eram, também, construidos em pedra seca e nisso se distinguiam das cisternas que eram argamassadas com uma mistura de barro e cal e rebocadas.
A maioria dos poços, designadamente os mais característicos, com cobertura de telha, estão hoje desaparecidos.
Sobram, no entanto alguns com falso aspecto de cisterna, como é o caso do que foi construído pelo meu avô Joaquim Coelho Quitério: tem cobertura de cimento armado e, apenas na parte que emerge da terra, a parede rebocada pelo exterior, como se vê na fotografia seguinte:



Das paredes de edifícios, construídas em pedra seca, o caso mais notável, pela qualidade da construção, que se pode ver nas ruas da Ataíja, é a parede de um anexo à residência que foi de Maria Branca, na Rua das Hortas, de que a fotografia seguinte apresenta um pormenor. De notar que quando esta parede foi construída já não havia na Ataíja pedreiros especializados nesta técnica tendo, segundo me explicou Joaquina Branco, a construção sido feita a mandado de seu pai por pedreiros que vieram "de trás da serra".

 

terça-feira, 29 de junho de 2010

A origem do nome ATAÍJA – Outra hipótese

Em 17-11-2009, publicámos aqui o post “A origem do nome ATAÍJA”, no qual, refutámos a ideia de M. Vieira Natividade, segundo a qual tal nome derivaria de um antigo vocábulo atà-hij, significando: até ahi (até aí chegava olival dos frades), e subscrevemos a tese da origem árabe do nome ataíja, 



com o significado de coroada, tal como já em 1789, Frei João de Sousa defendeu na sua obra Vestigios da lingua arabica em Portugal ou Lexicon ethymologico de palavras e nomes portuguezes que teem origem arábica.
Naquele texto alertámos, também, para o facto de que muitas vezes os nomes dos sítios se mantém, independentemente da mudança do domínio que sobre eles se exerce e demos vários exemplos.
Obviamente, não sustentamos que tivessem sido os mouros (os povos de religião muçulmana que ocuparam a Península Ibérica não eram árabes mas, sim norte-africanos, berberes) a inventar o nome Ataíja, porquanto bem e comprovadamente se sabe que a região foi ocupada anteriormente, desde logo por povos do neolítico que deixaram abundantes vestígios da sua passagem, designadamente nas grutas do Carvalhal exploradas por M. V. Natividade.
Que tais povos e, ou, os outros que lhes sucederam, tenham nominado os locais onde viviam, nada é mais natural. E, para que essa nominação tenha chegado aos nossos dias, teria bastado que a ocupação humana tivesse sido contínua, transmitindo-se, assim, os nomes de geração em geração.

Pode, assim, admitir-se que o nome Ataíja seja de origem anterior à ocupação moura sendo certo que sobre esses tempos muito pouco se sabe, fruto de uma cultura que sempre tendeu a desvalorizar e, por vezes, a ocultar todo o passado que não respeitasse à herança greco-latina e árabe.

Moisés Espírito Santo, natural da Batalha, etnólogo e sociólogo, professor catedrático da Universidade Nova de Lisboa, é dos raros investigadores que tem dedicado atenção a essas civilizações desaparecidas, procurando ir para além do paradigma latino-árabe, na linha de Paul Deschamps que já em 1939, em “L’Histoire Sociale du Portugal”, defendia que “A influência árabe, em Portugal, foi menos importante do que se julga. Certas palavras têm uma falsa etimologia árabe ou uma origem mista, outros têm sido falsamente atribuídas aos Árabes com o pretexto de que estes são semitas. Nós sabemos que essas palavras vêm dos Fenícios, e que outras são simplesmente hebraicas.”
(citado a partir de: http://www.netsaber.com.%20br//biografias/verbiografiac3545.html)

É assim que, no seu livro “Cinco Mil Anos de Cultura a Oeste – etno-história da religião popular numa região da Estremadura”, Assírio &Alvim, Lisboa, 2004, Moisés Espírito Santo avança, com larga argumentação, a teoria de que o topónimo Ataíja se referiu ao título de uma divindade que podia ser a fenícia e púnica Istar, Anat ou Anta ou a egípcia e greco-romana Ísis.

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Nota: Os assírios, foram um povo marinheiro, originário da região onde hoje se situam Israel, o Líbano e a Síria. Fundaram, com base em Cartago, junto a Tunis, actual capital da Tunísia, um império que, nos Séc. III e II antes de Cristo, dominou o Norte de África, o comércio e as maiores ilhas do mar mediterrâneo e o sul da Península Ibérica. O Império Cartaginês foi derrotado pela República Romana durante as chamadas Guerras Púnicas.

domingo, 20 de junho de 2010

Citernas

Durante toda a existência secular da Ataíja, a falta de nascentes de água constituiu um fortíssimo condicionante das condições de vida.


A água para beber e cozinhar recolhia-se nos poços e cisternas, para lavar a roupa e para dar de beber aos animais recorria-se à Lagoa Ruiva.

Quando eu era menino, as portas das casas ficavam apenas na tranqueta mas a citerna era fechada à chave e, quando, como era normal, mais de uma família se abastecia na mesma citerna, o número de cântaros que se podiam retirar dela eram rigorosamente controlados.

Para manter a água limpa de matéria orgânica, era costume recolher alguns peixes no Rio de Chiqueda e lançá-los dentro da cisterna.


O surgimento, em 1992 ou 1993, não me recordo bem, do abastecimento público de água, modificou drasticamente a relação dos ataíjenses com a água e levou ao desaparecimento da Lagoa Ruiva e de muitos poços e cisternas e ao abandono de outros tantos.

A cisterna a que, na linguagem ataíjense, chamamos citerna, é um reservatório estanque de águas, de paredes em pedra argamassada, rebocada e caiada que recebe as águas da chuva exclusivamente através de recolha em superfícies impermeáveis: eiras de pedra, telhados das casas e cobertura da própria cisterna.

Há-as de vários tipos: de abóbada semi-esférica, de telhado de uma ou duas águas, de cobertura plana feita com grandes lages ou, as mais recentes, com cobertura plana em cimento armado ou com estrutura de pré-esforçado.






Cisterna de data de construção desconhecida mas, seguramente, do Séc. XIX ou anterior, no pátio da casa que foi de António do Casal, (foto de 2006)


A mesma cisterna, vendo-se o sistema que permite a recolha das águas da cobertura, (foto de 2006)


Cisterna no quintal de Manuel Luís de Sousa. construída nos anos 20 do Séx. XX, (foto de 2010)


Cisterna com cobertura plana, de lages, junto à casa do Olival do Sá, construída nos inícios do Séc. XX (foto de 2007)


Cisterna construída cerca de 1977, integrada no interior dos anexos de uma casa, (foto de 2007)



sexta-feira, 11 de junho de 2010

Estudos sobre a Ataíja de Cima

Em 1993, no âmbito do plano “Primavera Cultural 93” da ADEPA e sob o decisivo impulso e dinamização do nosso conterrâneo Américo Sabino, um grupo de jovens ataíjenses, constituído por:

Elisabete Coelho;
Sílvia Moura;
Tânia de Sousa;
Paulo Jorge;
Luís Constantino;
António Veríssimo;
Helder Catarino;
José Luís;
Mário Cordeiro;
Carla Maurício;
Paula Coelho;
Luís Vigário;
Arménio Coelho;
Aníbal Tomé; e
João Ricardo,
fez um levantamento etnográfico que, organizado pelo Américo de Sousa Sabino e pelo então jovem investigador alcobacense, o hoje Doutor António Valério Maduro, foi publicado sob o título “ A ARQUITECTURA POPULAR TRADICIONAL DA SERRA DOS CANDEEIROS”.

Trata-se de um pequeno opúsculo, de 32 páginas, que analisa a estrutura da casa tradicional ataijense, com capítulos dedicados a cada um dos seus principais elementos: caracterização exterior, a casa de fora, os quartos, a cozinha e a despensa e os anexos.

Na mesma época, foi distribuído um pequeno estudo policopiado de minha autoria, de apenas 9 págs. A4, intitulado “Uma casa em Ataíja de Cima” onde, em pequenos capítulos se abordam, brevemente, os seguintes temas: Topónimo, Economia, A Quinta, População, Propriedade, A Casa, Planta Básica da Casa Ataíjense (esquema) e Planta de Uma Casa Ataíjense (esquema), analisando-se, neste último, uma casa concreta.

Estes são os únicos trabalhos exclusivamente dedicados à Ataíja de Cima que, até agora e que eu tenha conhecimento, foram publicados.


capa do opúsculo A ARQUITECTURA POPULAR TRADICIONAL DA SERRA DOS CANDEEIROS, ilustrada com um belo desenho da Casa Alta do Outeiro, da autoria de Henrique Aranda

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Exposição de Inês Neves


Está aberta, desde o passado Sábado, dia 5 e até ao dia 27 de corrente mês de Junho, no Salão Nobre da Adega Cooperativa de Alcobaça (na estrada para Leiria, entre o LIDL e o Museu Nacional do Vinho) a exposição dos trabalhos da artista ataíjense Inês Neves.
O núcleo central da exposição é, como já referimos em post anterior, constituído por oitenta e oito aguarelas que retratam a totalidade dos edifícios religiosos do concelho de Alcobaça, desde os Mosteiros de Alcobaça e de Cós, às Igrejas Paroquiais e a todas as capelas, até à mais simples e modesta ermida.
Para além da valia técnica e artística das pinturas expostas, o conjunto da exposição tem, assim, um interesse iconográfico acrescido, uma vez que retrata exaustivamente todo o património religioso edificado do concelho.
Além das aguarelas, estão ainda patentes alguns quadros a óleo e um grande e muito interessante painel de azulejos retratando o Mosteiro de Alcobaça.
A artista apresenta, ainda, interessantes estatuetas de duas figuras míticas ligadas a Aljubarrota: O Condestável, São Nuno Alvares Pereira e a famosa Padeira, além de outros trabalhos como caixas pintadas para diversas utilizações.

Para aguçar o interesse do leitor e lhe mostrar que vale bem a pena uma deslocação até à Adega Cooperativa de Alcobaça, aqui ficam reproduções fotográficas de alguns dos trabalhos expostos.



Aguarela representando a Capela de Nossa Senhora da Graça da Ataíja de Cima, tal como era nos anos setenta do Séc. XX, logo após o alcatroamento da Estrada do Lagar dos Frades



Estatueta pintada, representando Brites de Almeida, a Padeira de Aljubarrota



Úteis e bonitas caixas decoradas




Visite a exposição e o site http://www.artederecordaravida.blogspot.com/.




sábado, 29 de maio de 2010

Quando a festa de Nossa Senhora da Graça se celebrava no dia 1 de Janeiro

Por aviso de 18 de Janeiro de 1758, o Secretário de Estado dos Negócios do Reino, Sebastião José de Carvalho e Melo (Marquês de Pombal), fez remeter, através dos principais prelados, e para todos os párocos do reino, os interrogatórios sobre as paróquias e povoações, pedindo as suas descrições geográficas, demográficas, históricas, económicas, e administrativas e a indicação dos estragos provocados pelo terramoto de 1 de Novembro de 1755.

As respostas ao inquérito, naturalmente manuscritas, também chamadas Memórias Paroquiais,  encontram-se actualmente reunidas em 43 volumes, à guarda da Torre do Tombo e constituem um documento único que nos fornece uma grande massa de informações sobre todo o país e como ele era naquele ano de 1758. Estas informações estão hoje à disposição de todos, sendo facilmente acessíveis na Internet através do endereço: http://digitarq.dgarq.gov.pt/


A parte relativa às respostas dadas, em 27 de Abril de 1758, pelo Cura de São Vicente de Aljubarrota tem, infelizmente, dois problemas:

O padre escrevia muito mal e,
Várias das folhas encontram-se muito deterioradas e, por isso, em boa parte, totalmente ilegíveis.


É, no entanto, possível recolher informações interessantes sobre a freguesia e sobre a Ataíja de Cima e descobrir, por exemplo que, há 252 anos, a Festa de Nossa Senhora da Graça se celebrava no dia um de Janeiro:



O que, transcrito, dá:

Tem (a freguesia de São Vicente de Aljubarrota) mais a capella de Nossa Senhora da Graça cuja Imagem parece tam bem antiga e de pedra é do povo daquele lugar que se chama Ataija de Sima esta capella esta em um largo no meyo do lugar…….. alguns rendimentos que tem que servem para a fabrica da dicta Capella e festa da mesma Senhora que la faz em dia da oitava do Natal e nesse dia acode a ella bastante gente dos povos vezinhos, e tem também esta capella em o altar a imagem do Menino Jesus.


Notas:
- As reticências referem-se a uma pequena parte do texto que não conseguimos decifrar
- A oitava do Natal é, no calendário litúrgico, o período de oito dias que se segue ao Dia de Natal.
- Na oitava do Natal (1 de Janeiro) a Igreja Católica celebra a festa litúrgica de Santa Maria, Mãe de Deus. É isso que explica que a festa de Nossa Senhora da Graça da Ataíja de Cima se realizasse naquele dia.