terça-feira, 30 de março de 2021

Um “marroquino” no Carrascal

 


No livro dos casamentos da freguesia de N. S. dos Prazeres de Aljubarrota surge-nos, em 21 de setembro de 1790, o casamento de António de Melo enjeitado do Hospital Real da Cidade de Marzagam.

Ora, Marzagam, Marzagão, há, pelo menos, três:

A freguesia de Marzagão, em Carrazeda de Ansiães;

Um município no Estado de Goiás, no Brasil, fundado no Século XX e actualmente com cerca de 2.500 habitantes;

Um distrito, no município de Rosário Oeste, no Estado do Mato Grosso, no Brasil, igualmente fundado no Século XX e actualmente com cerca de 1.400 habitantes;

Nenhuma destas teve alguma vez um Hospital Real pelo que não era a nenhuma delas que o padre se referia.

Mazagão é nome parecido, mas há também diversas. Vejamos:

Mazagão (Mazagaon), no século XVI uma ilha e hoje uma área da cidade de Bombaim, (Mumbai) na União Indiana, cujo nome alguns atribuem a colonos portugueses do século XVI. Também não foi esta a localidade em que o António de Melo foi enjeitado, desde logo porque Bombaim já não estava na posse dos portugueses desde 1661, quando passou ao domínio inglês incluída no dote de D. Catarina de Bragança que então casou com o rei de Inglaterra, Carlos II.

Mazagão, inicialmente chamada Nova Mazagão, hoje uma pequena povoação chamada Mazagão Velho[i] a trinta quilómetros da Mazagão Nova, actual sede do município, tudo na margem do Rio Amazonas, no Estado do Amapá, Brasil, foi fundada em 1770 por determinação do Marquês de Pombal que para aí quis forçar a emigração de todos os portugueses retirados da praça marroquina de Mazagão na sequência do abandono desta nos termos do Tratado de Paz celebrado com o Sultão de Marrocos.

Mazagão, hoje El Jadida, em Marrocos, foi uma praça militar na orla costeira atlântica, uma das mais importantes cidades fortificadas que os portugueses ali detiveram. Foi ocupada entre 1486 e 1769, tendo sido a última do norte de África a ser abandonada, depois de Ceuta perdida para Espanha na sequência da Guerra da Restauração, e de Tânger que, tal como Bombaim, passou para Inglaterra como parte do dote de D. Catarina de Bragança. [ii], [iii]

Tudo visto, o nosso António Mello, enjeitado do Hospital Real da Cidade de Marzagam, que em 21 de Setembro de 1791 casou em N. S. dos Prazeres de Aljubarrota com Teodora Machado, com quem foi morar na aldeia do Carrascal, só pode ter sido enjeitado na cidade marroquina de Mazagão, nos últimos anos da sua ocupação portuguesa.

Sendo de admitir que o António Mello teria na data do seu casamento uma idade próxima aos 30 anos (o que, talvez, o assento do seu óbito poderá melhor precisar) significa isso que terá nascido cerca de 1760 e era uma criança quando Mazagão foi abandonada pelos portugueses.

Mazagão era, ao tempo do provável nascimento do António Mello, uma cidade sitiada, alvo de frequentes ataques e cercos, tendo o mar como única porta de saída e dependendo da metrópole portuguesa como fonte de abastecimentos. Lá residiam, todos com as suas famílias, os militares, os burocratas, os comerciantes, os artesãos e os seus criados e escravos, perfazendo menos de duas mil pessoas.

O que terá levado ao seu enjeitamento?

Quem seriam os seus pais? Era filho de portugueses? De português(a) e escravo(a)? De português(a) e mouro(a)? O seu aspecto físico denunciava a sua progenitura?

Como chegou ao Carrascal?

Terá vindo bébé de Mazagão para Portugal e aqui sido dado a criar a uma ama, como acontecia aos enjeitados do Real Hospital de Lisboa, ou terá vindo com os demais portugueses que em 1769 aqui fizeram escala antes de serem reencaminhados para o Brasil onde, aliás, chegou apenas cerca de metade, umas 340 famílias, tendo os outros logrado ficar em Portugal?

 

A cidadela de Mazagão em meados do Séc. XVIII

 



[i] Quando andava em busca de elementos que me permitissem deslindar o local de enjeitamento do António de Mello encontrei um interessantíssimo relatório de trabalhos arqueológicos intitulado Uma Vila Pombalina na Amazônia - Mazagão Velho Em Uma Perspectiva Arqueológica, de Marcos Albuquerque e Veleda Lucena, Editora CRV, Curitiba, Brasil, 2020, que não só dá um amplo relato da fundação e vicissitudes da Mazagão amazónica, como constitui um límpido roteiro dos trabalhos arqueológicos ali realizados.

[ii] É extensa a bibliografia sobre a presença portuguesa em Marrocos muita dela acessível gratuitamente na internet mas, por toda, recomendo Os Portugueses em Marrocos, de António Dias Farinha, Edição Instituto Camões, Lisboa, 1999.

[iii] As fortificações portuguesas de Mazagão fazem parte, desde 2004, da lista do Património da humanidade da UNESCO.

terça-feira, 23 de março de 2021

A Estrada de D. Maria Pia e a Estalagem da Malaposta da Pedreira dos Carvalhos

 


No final do Séc. XVIII, mais precisamente em 1791, quando reinava a Sra. D. Maria I, foi elaborado o projecto da Estrada de Rio Maior a Leiria[i] que, por isso, ainda hoje é conhecida por Estrada de D. Maria Pia.

Aprovada por despacho, de 4 de junho de 1792, do Desembargador superintendente geral das Estradas, José Diogo de Mascarenhas Neto e construída nos anos seguintes, por ela circulou a partir de 1798 a carreira da Malaposta de Lisboa a Coimbra.

O referido despacho que se encontra integralmente transcrito por Ricardo Charters de Azevedo[ii], tal como, aliás, o projecto de “delineamento” da estrada, contém abundante informação sobre a região, incluindo os pontos de água usáveis pelos viajantes e animais de tiro e, por isso, absolutamente indispensáveis: “a maior distancia … he de três legoas desde os Candieiros athe aos Carvalhos[iii], mas quase no meio deste espaço há o poço do Muliano”.

As estalagens, ponto de alimentação e dormida ou descanso de viajantes e bestas e de muda das atrelagens, tinham de estar situadas, ao longo do percurso, a distâncias mais ou menos regulares que permitissem a substituição das parelhas, daí que o despacho não esqueça que “o sitio dos Candieiros necessita de huma estalage, e da mesma forma o dos Carvalhos”, (em 1791, conforme o Mapa, já existia uma estalagem na Cumeira de Cima[iv], no entanto, fora do caminho agora delineado).

Na caracterização da região a que, como justificação pela opção tomada, o despacho procede, o uso do solo também não foi esquecido, notando o desembargador que “a agricultura do terreno compreendido no mappa consiste em azeite, trigo, milho e vinha principalmente na porção que pertence aos Coutos”[v]

Num espaço escassamente povoado, tendo “cada legoa quadrada menos q 1800 habitantes” e muito pobre, onde os povos “respirão pobreza e rusticidade”, a estrada iria ainda, aos olhos do superintendente, contribuir para “o aumento da população e o progresso da agricultura”.

Aquando das Invasões francesas a Malaposta Lisboa – Coimbra já não existia, uma vez que face aos persistentes deficits de exploração o serviço foi extinto, tendo durado escassos seis anos, entre 1978 e 1804.

A partir daí e durante mais seis anos não conhecemos outras referências à estalagem dos Carvalhos, mas em Outubro de 1810, aquando da 3ª Invasão Francesa, a Estrada de D. Maria I foi um dos caminhos seguidos a partir de Leiria, pelos exércitos de Wellington, no seu recuo para as linhas de Torres, bem como pelos exércitos franceses de Massena que o perseguiam. De acordo com o General Koch[vi], em 7 de outubro Soult[vii] instalou-se nos Carvalhos[viii], Sainte-Croix bateu a região entre Molianos e Candeeiros e o General Montbrun instalou-se, com a artilharia, “à direita dos Molianos”.[ix]

Koch não menciona o estado da estrada, que ainda havia de ser bom, mas não podia dizer pior da zona: “É impossível ver uma região mais miseranda que a que vai de Carvalhos a Rio Maior; Candeeiros e Moliano não têm, sequer, o aspecto de lugarejos, e só apresentam meia dúzia de péssimas cabanas esparsas numa planície nua e árida onde não há cereais nem forragem nem água”.

Demos o devido desconto ao militar frustrado e cansado, mas lembremo-nos do que o Desembargador Mascarenhas Neto tinha dito dezoito anos antes.

Enquanto durou, a Malaposta teve na Estalagem dos Carvalhos um importante ponto de apoio, já que era aí que se cruzavam, era servida a ceia[x] e passavam a noite as carruagens vindas de Lisboa e de Coimbra, tudo conforme minuciosamente regulado nas Instruções para o estabelecimento das diligências entre Lisboa e Coimbra[xi].

A estalagem dos Candeeiros, referida no despacho mencionado do Desembargador Mascarenhas Neto, parece não ter chegado a ser construída, mas o lugar continuou a ter a importância resultante da existência de água no Poço dos Candieiros. Nos Molianos é também referida a existência de um poço, “de q uzam os habitantes daquele distrito”, o qual, no entanto, não é assinalado no Mappa de 1791.

Eventualmente relevantes para os viajantes deste troço do caminho terão sido as Vendas nele existentes que eram, segundo o Mappa, a Venda do Vintém, na Moita do Gavião, a Venda dos Candeeiros e a Venda da Laranja, perto da Sra. da Piedade (Molianos).

A falta de uso e de manutenção haviam de arrastar a Estalagem dos Carvalhos, para alguma degradação. Diz Godofredo Ferreira que “com a passagem do exército invasor do comando do General Massena, a casa ficou em ruína e quasi abandonada”. Na verdade, o exército francês não terá usado a estalagem por mais do que alguns dias, pelo que a ruína só poderia ter sido provocada na retirada e, para ser ruína, teria de ter sido incendiada. Mas, não há qualquer indício de isso ter acontecido. Pelo contrário, ela volta a ser arrendada logo em 1814, pelo que não estaria em muito mau estado nessa data.

O desvio da estrada real para as Caldas da Rainha e Alcobaça implicou o abandono da estrada de D. Maria Pia, a qual só veio a retomar importância no início dos anos 60 do Séc. XX, com a construção do actual IC2. Consequentemente, o serviço de diligências, quando é retomado em meados do Séc. XIX, já não passa pelas Pedreiras pelo que a Estalagem nunca voltou à sua função inicial e acabou por ser vendida em hasta pública cerca de 1856[xii]

Depois disso foi mercearia, taberna e habitação. No lugar das cavalariças, houve um lagar de azeite e na cozinha ainda há uns quarenta anos existia a grande chaminé.

Recentemente, sobre as velhas paredes, foi construída uma vivenda cujo primeiro andar assenta na cornija original de cantaria, em meia cana simples, que corre toda a fachada.

O traçado original da Estrada de D. Maria ainda hoje é facilmente reconhecido na quase totalidade do percurso entre a Moita do Gavião e as Pedreiras, constituindo, aliás, a rua principal de diversas localidades, nomeadamente, os Candeeiros, os Molianos e as Pedreiras.

Em Maio de 2020, era este o aspecto da Estalagem dos Carvalhos:


O portão da Estalagem tal como foi construído há mais de 220 anos

Vista Geral da Fachada

Uma habitação moderna construída sobre as velhas paredes



[i] Ver Ricardo Charters de Azevedo, A Estrada Rio Maior a Leiria em 1791, colecção Tempos Vidas, 15, Textiverso, Leiria, 2011.
[ii] Op.cit., págs. 55 e 56.
[iii] Ou Pedreira dos Carvalhos, que hoje conhecemos por Pedreiras.
[iv] Acima da Cumeira há um lugar chamado Albergaria. Poderiam, albergaria e estalagem, ser uma e a mesma coisa. No entanto, o Mapa assinala ambas.
[v] Aos Coutos da Alcobaça, obviamente.
[vi] General Koch, Memórias de Massena, Campanha de 1810 e 1811 em Portugal, Introdução de António Ventura, Livros Horizonte, Lisboa, 2007
[vii] General de Napoleão. Foi o comandante da 2ª Invasão de Portugal.
[viii] Certamente na Estalagem que, apenas seis anos após o fim do serviço da Malaposta, ainda havia de estar em relativo bom estado de uso e, comparativamente com quaisquer outras construções da região,  com as melhores condições para o alojamento do Estado-Maior da Brigada.
[ix] Em Janeiro de 1834, pouco mais de 23 anos depois destes acontecimentos, de novo a região entre Molianos e as Pedreiras foi objecto de ocupações militares. Ver: neste Blog A Guerra Civil (1832-1834) na nossa região, in Ataíja de Cima: A Guerra Civil (1832-1834) na nossa região (ataijadecima.blogspot.com)
[x] A ceia era a refeição da noite, a que agora chamamos jantar. O jantar era a refeição do meio do dia, aa que agora chamamos almoço, servida cerca das duas horas da tarde. Ainda era assim na aldeia da minha infância.
[xi] Godofredo Ferreira, A Mala-Posta em Portugal, Lisboa, 1946, citado em Armindo Vieira, Pequena Monografia das Pedreiras, Pedreiras (Porto de Mós), Maio 2007.
[xii] Armindo Vieira, op.cit., de onde também se retiraram as demais referências aos usos do local.

sexta-feira, 12 de março de 2021

Casamentos em S. Vicente de Aljubarrota na 1ª Década do Século XIX

 

Dos livros de casamentos da Freguesia de S. Vicente de Aljubarrota que se encontram digitalizados e actualmente disponíveis em digitarq.adlra.pt,[i] o mais antigo é o Livro de Casamentos da Fregª de S. Vicente / Livro 1º / 1802 a 1826, cujo termo de abertura é o seguinte:

“Este livro é para se fazerem os assentos dos casamentos da Fregª de S. Vicente de Aljubarrota deste Bispado de Leiria 12 de Janrº de 1803 Dr. José Joaquim Duarte Amado

Sem embargo, o primeiro dos assentos é relativo a um casamento ocorrido em 7 de Dezembro de 1802. Vamos desprezar este e concentrarmo-nos nos celebrados na década correspondente aos anos de 1803 a 1812.

 No período celebraram-se um total de 68 casamentos, à média de 6,8 casamentos/ano variando o nº efectivo de casamentos entre o máximo de 11 (em 1803 e 11812) e o mínimo de 3 em 1810.

 


1810 foi o ano em que, em Outubro, após a Batalha do Buçaco, a região foi vítima da passagem sucessiva dos exércitos de Wellington que no seu recuo para as linhas de Torres e a política de terra queimada, provocou grandes devastações, e de Massena que, em perseguição daquele, esteve acampado na Região[ii] e, daí até à sua retirada em abril de 1811, ficaram estacionadas em frente das linhas de Torres e na região entre Rio Maior e Santarém e fizeram sucessivas incursões na região para pilhagem de alimentos e forragens. No entanto, não parece poder afirmar-se uma relação directa entre o diminuto número de casamentos havidos nesse ano em S. Vicente e esses factos, porquanto, tratando-se embora do ano com menor número de casamento (3) a verdade é que um deles foi celebrado em novembro tendo os outros dois tido lugar em fevereiro e março anteriores, mas nenhum nos restantes meses, nem janeiro ou setembro, dois dos meses normalmente com mais casamentos.

Olhando para a distribuição dos casamentos ao longo do ano, tem-se uma confirmação do ditado popular que postula que “boda molhada é boda abençoada”. De facto, a distribuição do somatório dos casamentos do período pelos meses do ano, dá o seguinte resultado:

Distribuição dos casamentos pelos meses do ano

jan

fev

mar

abr

mai

jun

jul

ago

set

out

nov

dez

8

4

1

3

1

1

1

3

14

6

22

4

EEm flagrante contraste com a actualidade, quando os meses de Verão são os preferidos para as festas de casamento.

Neste período paroquiaram S. Vicente de Aljubarrota 3 padres: o Cura Tomás de Aquino da Costa, que o fazia desde 1793 e prolongou o seu magistério até novembro de 1810, quando foi sucedido pelo Cura José Maria de Sequeira que assinou o seu primeiro casamento em abril de 1811, mantendo-se até abril de 1812, seguindo-se o Cura José Joaquim Leitão que assina o seu primeiro assento de casamento em junho de 1812. Dos 2 primeiros os assentos que agora estudamos não nos fornecem outros elementos. Do padre José Joaquim Leitão, ficamos a saber que em janeiro de 1803 já era padre coadjutor da freguesia de S. Vicente e que em 1805 era igualmente coadjutor mas, agora, de Nossa Senhora dos Prazeres, da mesma Vila de Aljubarrota, cargo que também desempenhava em 1809. Não deixa de ser curioso este trânsito do padre entre as duas freguesias de Aljubarrota, sabendo nós que o curato de S. Vicente era da apresentação das Colegiadas de Porto de Mós[iii], enquanto o Vigário de Nossa Senhora dos Prazeres era apresentado pelo Abade Bernardo de Alcobaça[iv].

Os assentos mencionam, seja como oficiantes, seja como testemunhas, além dos curas Tomás de Aquino da Costa e José Maria de Sequeira, mais os seguintes padres, todos eles, como havemos de ver em outros estudos, naturais do concelho de Aljubarrota.

- José Joaquim Leitão, ou José Leitão, ou Joaquim Leitão que, como vemos, foi Coadjutor de S. Vicente e de Nossa Senhora dos Prazeres e, finalmente, Cura de S. Vicente.
- João Gomes, da Ataíja de Cima.
- Joaquim de Sousa, natural da Ataíja de Cima que, sabemo-lo, foi Cura da Paróquia de Santo António do Arrimal e faleceu em 4-2-1827, sendo sepultado na Capela da Nossa Senhora da Graça da Ataíja de Cima.[v]
- José Coelho, do Casal da Eva.
- Manuel Coelho de Sousa, ou Manuel Coelho, ou Manuel de Sousa, natural dos Casais de Santa Teresa, cujo testamento já estudámos .[vi]
- Rufino da Fonseca, que em Dezembro de 1808 é vigário encomendado de Nossa Senhora dos Prazeres
- João Pedro da Cunha, prior de S. Pedro de Porto de Mós
- António José Gomes Botelho, certamente familiar dos capitães Manuel Pedro (Manuel Pedro Gomes Botelho) e Gregório José Gomes Botelho.
- Reverendo Dr. José de Sousa, da Vila.

E, outras pessoas importantes:

- Alferes José Tavares Amado ou José Tavares
- Capitão José Joaquim Tavares Amado, ou José Tavares Amado. Trata-se, certamente, da mesma pessoa que em 1807 era Alferes e em 1809 já era Capitão.
- Alferes António da Fonseca, natural de Leiria casado com Josefa Clara Xavier do Couto, natural de Famalicão, mas residentes em Aljubarrota de onde era natural a filha Rita Rosa da Fonseca que casou com o viúvo Francisco Viegas Machado que já encontrámos como proprietário de escravos[vii].
- Capitão Bartolomeu José Rodrigues Carreira, ou Bartolomeu Rodrigues Carreira, casado com D. Maria Doroteia Ângela de Sequeira, pais de Fortunata Maurício de Sequeira que casou com Joaquim Bernardo, filho do Dr. Silvestre Triaga de Mendonça
- Capitão Manuel Pedro Gomes Botelho, ou Manuel Pedro
- Dr. Francisco Correia Triaga de Mendonça, ou Francisco Correia, ou Francisco Correia Triga, ou Francisco Correia de Mendonça.
- Dr. Silvestre Triaga de Mendonça.

Os casamentos eram por regra celebrados na Igreja Paroquial de S. Vicente. No entanto, um deles teve lugar na Paroquial de N. S. dos Prazeres e outros em capelas das aldeias da freguesia: cinco em N. S. da Graça, da Ataíja de Cima, três em Santa Teresa, dos Casais de Santa Teresa e um em S. Sebastião, na Ataíja de Baixo. Parece não haver nenhuma razão especial para o facto que, acreditamos, se deverá à vontade dos noivos.

Os párocos raramente assinalaram o estado dos noivos. Onde não há outra indicação, presume-se que eram solteiros, o que, expressamente, só é dito em 10 casos no que diz respeito aos noivos e 11 no que respeita às noivas. Como viúvos, geralmente com identificação do cônjuge falecido, são indicados 13 noivos (19,1%) e 5 noivas (7,3%), sendo que num único caso ambos são viúvos.

Onde foram viver os novos casais?

O filho do Dr. Triaga e a filha do Capitão Bartolomeu, foram assistir para a Quinta de S. Paio, Freguesia de Santa Maria da Vila de Porto de Mós.

De quatro não se indica o lugar do novo lar e, dos que saíram da freguesia, seis fixaram-se em diferentes lugares da outra freguesia de Aljubarrota, N. S. dos Prazeres, cinco foram para outras freguesias que hoje fazem parte do concelho de Alcobaça (Alpedriz, Cela, Évora, Maiorga e S. Martinho do Porto), um ficou-se na fronteira da freguesia, em Cumeira de Cima, já na freguesia do Juncal e Concelho de Porto de mós. Apenas um casal foi viver mais longe, em Abitureiras (a meio caminho entre Rio Maior e Santarém).

Os outros cinquenta ficaram na freguesia, em regra na aldeia de onde eram, ou um deles, originários. Ou seja, 73,5% dos novos casais ficaram a residir na freguesia e mais 8,8% na freguesia de Nossa Senhora dos Prazeres. O que significa que, pelo menos 82,3% desses novos casais se fixou na área da actual freguesia de Aljubarrota, distribuídos pelos diversos lugares, como segue:

 

Lugares da freguesia onde assentaram os novos casais

(N. S. Prazeres)

Ataíja de Baixo

Ataija de Cima

Cadoiço

Casais S. Teresa

Cumeira de Baixo

Vila (S. Vicente)

6

12

12

6

11

3

6

 Fará aqui sentido lembrar que, cerca de cinquenta anos antes, as Memórias Paroquiais indicam para alguns destes lugares os seguintes vizinhos: Ataíja de Baixo 32, Ataíja de Cima 53, Cadoiço 10, Casais S. Teresa 32, Vila (S. Vicente) 73.

Independentemente do crescimento que tais lugares tenham ou não sofrido entre 1758 e 1802, assunto sobre o qual, de momento, não possuímos informação, o número de novos casais nesta 1ª década de 1800 representará, certamente, um importante acréscimo ao respectivo número de fogos e, por isso, ao crescimento populacional futuro.

 De onde eram naturais e onde moravam as pessoas referidas nestes assentos, noivos, pais e testemunhas?

Infelizmente, os assentos umas vezes são omissos e outras são pouco claros, não sendo fácil distinguir quem mora aonde, ou quem é natural de onde. Assim, não havendo condições para quantificar com rigor a frequência com que surge (ou devia surgir) cada uma das localidades mencionadas, o que seria interessante para analisar a mobilidade geográfica da população de Aljubarrota neste início do século XIX, diremos apenas que as povoações mais referidas são, naturalmente, aquelas da freguesia que mais beneficiaram da nupcialidade mas, também, povoações de freguesias vizinhas, desde logo Nossa Senhora dos Prazeres e, nesta, o Carvalhal, a sua maior aldeia mas, também, o Juncal e a Maiorga, ou a Cela. As referências à cidade de Lisboa (3), dizem respeito à naturalidade da mãe de um dos nubentes e, também, ao facto de dois deles serem expostos do “Real Hospital de Cidade de Lisboa”. Referências a localidades mais afastadas, são pontuais e dizem respeito a uma única pessoa por localidade.

Ainda assim, vale a pena elencar as sessenta povoações, casais ou lugares mencionados nestes assentos porque isso, a par das já referidas localidades de assento dos novos casais, nos dará apesar de tudo, alguma noção da referida mobilidade geográfica da população deste pequeno concelho rural. No quadro abaixo inclui-se o nome da povoação ou lugar, a freguesia respectiva e, se julgado necessário para melhor identificação, o município actual. 

Lista das povoações mencionadas nos assentos

 

Abitureiras, Santarém

Aldeia Galega da Merceana, Alenquer

Ataija de Baixo, SV

Ataíja de Cima, SV

Alvados, Porto de Mós

Andaínho, Juncal

Bispado de Orense, Reino da Galiza

Bizorreiro, Paião

Boavista NSP

Boieira, Juncal

Cadoiço, SV

Carvalhal, NSP

Casal da Boieira, Juncal

Casal da Eva, NSP

Casal da Fonte, Juncal

Casal da Ladeira, Pousos, Leiria

Casal do Botas, Maiorga

Casal da Ortiga, Évora

Casal do Mogo, SV

Casal do Rei, NSP

Casal do Rei, SV

Casal dos Vales, Maiorga

Casal Novo, Juncal

Casal Velho, Juncal

Casais de S. Teresa, SV

Casal do Boieiro, Juncal

Casal do Rei, SV

Cela

 Chãos, SV

 Chequeda, NSP

Cidade de Leiria

Cividade, Batalha

Costa Barrenta, Juncal

Cumeira de Baixo, SV

Cumeira de Cima, Juncal

Ervedeira, Coimbrão

Lisboa (RHCL)

Famalicão

Feteira, São João, Porto de Mós

Juncal

Lagoa do Cão, NSP

Maiorga

Moita, Pataias

Pedreira do Muliano, NSP

Pedreiras, S. Pedro, Porto de Mós

Póvoa, Cós

Quinta da Cruz, NSP

Quinta de S. Paio, Santa Maria, Porto de Mós

Quinta de Ricos Vales, Juncal

Rebotim, Alpedriz

Ribadaves, Souto da Carpalhosa

Ribeira de Cima, S. Pedro, Porto de Mós

Lisboa, S. Miguel de Alfama,

S. Paulo, Coimbra

S. Pedro, Porto de Mós

Sta. Maria, Porto de Mós

Várzeas, Souto da Carpalhosa

Venda Nova, S. Martinho do Porto

Vila, NSP

Vila, SVA

Viseu

Ou seja, tudo se passa numa área muito restrita centrada na freguesia e alargando-se, cada vez mais tenuemente, ao então concelho e aos concelhos imediatamente vizinhos. Fora isso, apenas uma ou outra pessoa justifica as raras referências a localidades mais distantes.



[i] Consultado em 12.03.2021

[ii] O General Koch, nas suas Memórias de Massena, Livros Horizonte, Lisboa, 22007, refere-se expressamente a tropas estacionadas em Calvaria, Alcobaça, Pedreiras, Molianos e Candeeiros

[iii] “ O parocho desta igreja é cura annual de alternativa; aprezentação das colegiadas de Sam Pedro e Santa Maria da villa de Porto de Moz”, conf. Memórias Paroquiais (1758). Volume III, João Cosme e José Varandas, Caleidoscópio e CHUL, Lisboa, 2011.

[iv] Conf. Loc. Cit.

[v] Ver Ordenação Sacerdotal de Fábio Bernardino, in Ataíja de Cima: Ordenação Sacerdotal de Fábio Bernardino (ataijadecima.blogspot.com), consultado em 12.03.2021

[vi] Ver O testamento do Padre Manoel de Souza, in Ataíja de Cima: O testamento do Padre Manoel de Souza (ataijadecima.blogspot.com), consultado em 12.03.2021

[vii] Ver Escravos em Aljubarrota, in Ataíja de Cima: Escravos em Aljubarrota (ataijadecima.blogspot.com), consultado em 12.03.2021