Um Imóvel de Interesse Público na Ataíja de Cima
A classificação como Imóvel de Interesse Público, a que se procedeu pelo Decreto-Lei n.º 67/97, de 31 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série, n.º 301, de 32-12-1997, da chamada Casa do Monge Lagareiro, não teve qualquer repercussão no local.
Ao nível científico, apesar do enorme fascínio que o Mosteiro de Alcobaça e a sua história exercem sobre tantos intelectuais, com os historiadores à cabeça, também não parece que tal classificação tenha despertado grande interesse pelo monumento já que, depois disso, apenas foi publicado o estudo intitulado “Breve Noticia sobre o Antiguo Lagar dos Frades em Ataíja de Cima (Alcobaça)”, de Maria do Céu Simões Tereno(a), publicado na “Cistercium", Revista Monástica, Julio – Septiembre, 2001, n.º 224(b), estudo esse que constitui o “estado da arte”, no que ao conhecimento científico deste monumento diz respeito.
Nele, centrando-se na arquitectura e no estado actual (1999-2000?) do edifício, a autora descreve o que viu e hoje, passada cerca de uma dúzia de anos, se encontra um pouco mais arruinado.
O texto recenseia o essencial da bibliografia relevante e é acompanhado por seis desenhos (c), um dos quais é uma tentativa de reconstituição da planta dos edifícios, feita a partir da descrição de J. Vieira Natividade e dezassete fotografias, cuja leitura é muito prejudicada pela má qualidade da reprodução e ausência de datação.
Uma dessas fotografias, “Figura 23 Antigo Lagar dos Frades. Fotografia do conjunto do lagar, mostrando ainda a Lagoa Ruiva”, é a mesma que já tinha sido publicada por J. Vieira Natividade em ilustração ao seu artigo “As Granjas do Mosteiro de Alcobaça”, in Boletim da Junta da província da Estremadura, – 2ª Série, n.º 5, Lisboa, 1944(d) (como, aliás, M. C. S. Tereno refere em Nota) e, com a legenda “Lagoa Ruiva e ruínas do LAGAR DOS FRADES (Ataíja)” está reproduzida na estampa XIII (1), inserta entre páginas 52 e 53 do livro “M. Vieira Natividade - Mosteiro e Coutos de Alcobaça - Alguns Capítulos Extraídos dos Manuscritos Inéditos do Autor e Publicados no Centenário do seu Nascimento, MCMLX” (e) .
Esta fotografia(f) é particularmente interessante, mostrando, em primeiro plano, a Lagoa Ruiva onde uma mulher lava roupa, uma criança brinca e um homem, com o seu carro de burro, enche uma barrica de água. Em segundo plano, vê-se a “Quinta”(g) , com o seu muro ainda quase intacto e a entrada, com as suas colunas e, em terceiro plano, as instalações do lagar, já bastante arruinadas e da Casa do Monge Lagareiro, esta com o telhado denunciando obras recentes (h).
Tudo somado, o que sabemos sobre o Lagar dos Frades da Ataíja de Cima e a Casa do Monge Lagareiro é, ainda, muito pouco e pode resumir-se ao que foi escrito por:
- Frei Manuel de Figueiredo, que dá notícia da sua construção;
- J. Vieira Natividade, que descreve o estado em que o encontrou no início do Séc. XX;
- Maria do Céu Simões Tereno, que descreve o estado em que o encontrou em 1999/2000.
No mais, a grande maioria dos diversos textos que se referem à Casa do Monge Lagareiro e ao Lagar dos Frades da Ataíja de Cima, não trás qualquer conhecimento novo.
Mas o tempo, esse grande escultor veio, recentemente, ensinar-nos mais alguma coisa:
A degradação do imóvel permite-nos ver, agora, que o famoso janelão cego que domina a fachada armoriada da Casa do Monge Lagareiro, servindo de suporte ao imponente Brasão de Cister é, afinal, falso e não, ao contrário do que parecia, uma janela entaipada:
NOTAS:
(a) Arquitecta, professora na Universidade de Évora, Doutora em Conservação do Património Arquitectónico, com uma tese intitulada “Contributo da Perspectiva para a Salvaguarda de Monumentos Históricos”.
(b) A revista "Cistercium" é patrocinada pela Conferencia Regional Española de Monasterios Cistercienses de la Estricta Observancia.
(c) Além de plantas de localização às escalas 1/25000 e 1/4000.
(d) Republicado (sem ilustrações) em “J. Vieira Natividade, Obras Várias, II”, Edição da Comissão Promotora das Cerimónias comemorativas do I Aniversário da Morte do Prof. J. Vieira Natividade, Alcobaça, s/data (o Prof. J. Vieira Natividade nasceu em 22-11-1899 e faleceu em 19-11-1968, esta edição será, portanto, de cerca de 1970).
(e) O livro reúne um conjunto de inéditos de Manuel Vieira Natividade, escritos entre 1878 e 1918, coligidos pelo filho do autor, o Eng.º Agrónomo Prof. Joaquim Vieira Natividade. As fotografias não são datadas e não têm indicação de autor. No entanto, as insertas no referido Boletim, são aí mencionadas como sendo da autoria de J. Vieira Natividade.
(f) Provavelmente tirada nos primeiros anos da década de 1940.
(g) “Quinta”, é o nome porque, na Ataíja de Cima, sempre ouvi designar o terreno murado onde se situa a Casa do Monge Lagareiro.
(h) O espaço era, ainda na segunda metade do Séc. XX, utilizado como palheiro pelo proprietário, José Horta Henriques que foi conhecido por José Bernardo.
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