terça-feira, 16 de junho de 2020

Dois Ataijenses na Amazónia



No final do século XIX e princípios do século XX, muitos portugueses rumaram à Amazónia, tentando a sorte de colher algumas migalhas das fabulosas riquezas criadas pela exploração da borracha, riquezas essas que fizeram da Manaus daquele tempo uma cidade moderna e faustosa, onde a electricidade e outros benefícios da civilização chegaram mais cedo do que à maior parte do mundo.

Desses tempos de ouro restam ainda em Manaus diversos testemunhos, com destaque para Mercado Municipal e o Teatro Amazonas, este inaugurado em 1896, um grande e luxuoso teatro, ao nível dos melhores da Europa (https://cultura.am.gov.br/portal/teatro-amazonas/)

Em 1912, também Alberto o protagonista do romance A Selva, de Ferreira de Castro, tomou rumo semelhante e encontrou trabalho no seringal Paraíso.
Os leitores saberão das condições de quase escravatura em que decorria a vida dos seringueiros. Àqueles que o não sabem, recomendo vivamente a leitura desse grande romance que é A Selva.

Pouco antes, nos fins do ano de 1911, tinha sido a vez de os irmãos António Ribeiro, de 23 anos de idade e Luiz Ribeiro, de 21, naturais e residentes em Ataíja de Cima, requereram passaporte para sair de Portugal com destino a Manaus.

O seu pai, José Ribeiro, era filho de Luiz Ribeiro, carpinteiro, filho de José Ribeiro e de Guilhermina Maria, dos Casais de Santa Teresa que casou na Ataíja de Cima com Luísa Coelho ou Luísa Heitor, esta com raízes ataíjenses mais antigas, filha de Joaquim Heitor e Ana Umbelina.
Do Joaquim Heitor, nascido em 1789, sabemos ainda que era filho de Manuel Coelho e Maria Vicente e neto paterno de Luís Coelho e Maria Heitor e materno de Manuel Vicente e Maria Cordeiro.

O Luís Ribeiro e a sua mulher Luisa Coelho, tiveram outros filhos. Dez, no total, se não me engano. Seis raparigas, três de nome Maria, uma Felizarda, uma Francisca e uma Joaquina e quatro rapazes: João, João, José e Luiz.
Das Marias, sabemos que uma, nascida em 20.4.1848, faleceu com apenas três meses de idade. As outras duas Marias não as conseguimos localizar nos assentos paroquiais de casamento e óbito. Terão tido destino semelhante à irmã, como era comum naquele tempo ou talvez ainda as encontremos ou a uma delas em buscas mais atentas.
A Felizarda, a Francisca e a Joaquina casaram e tiveram descendência. Três, três e quatro filhos, respectivamente.

Do modo como Luís Ribeiro, o seu filho Luís Ribeiro Júnior e o seu neto José Ribeiro, através de sucessivas compras que se prolongaram por cerca de 100 anos, construíram uma das maiores Casas da Ataíja de Cima, a qual atingiu o seu apogeu em meados do século XX, quando abrangia mais de oitenta prédios rústicos e urbanos, já falámos no texto A Formação de Uma Casa Rural Ataijense 
Mas, porque é que foi o Luiz, o penúltimo dos filhos e o mais novo dos homens, a suceder a Luiz Ribeiro na posse e direcção da casa familiar?

Pois, pela razão de que era o único filho homem vivo.

Um João havia falecido inocente. O outro faleceu em 1877, solteiro, com a idade de 24 anos.
O José casou com Maria de Jesus, filha de João Maria Cláudio e de Maria da Graça e tiveram dois filhos: o António e o Luiz, os aventureiros que foram até à Amazónia.
Quando se casaram, em 9 de setembro de 1889, já o filho António, (nascido em 22 de Agosto de 1888) tinha mais de um ano de idade. Oito meses depois, em 1.5.1890, nasceu o segundo filho, Luiz como o seu avô e o seu tio. Mas, nessa altura já o pai José havia falecido, cerca de um mês antes, em 7.4.1890, depois de um curto casamento de apenas sete meses.

A Maria de Jesus achou-se assim, uma jovem ainda na casa dos vinte anos, viúva e com dois filhos pequenos.

Aquele não era um tempo, nem a Ataíja o lugar, para viúvas com filhos e, a Maria de Jesus, ao fim de trinta e dois meses de viuvez, em 8.12.1892, casou, em 2ªs núpcias, com Porfírio dos Santos, um sapateiro de 24 anos com quem teve uma filha, Joaquina, que foi conhecida por Joaquina Porfíria.

A ligação à família do marido, se é que ainda existia, há-de ter praticamente cessado por via deste segundo casamento.

Estas vicissitudes ajudam-nos, talvez, a entender melhor as razões que terão levado os filhos do seu primeiro casamento a emigrar.

Não sabemos qual foi a vida e ocupação dos nossos conterrâneos nas paragens amazónicas. Mas, sabemos, por memória familiar da descendência do Luiz, que o António aí faleceu, vítima da febre amarela, uma das doenças que, com a malária e a hepatite e, ainda, os ataques de animais selvagens como onças e serpentes, matou milhares de seringueiros.

Em data incerta, após a morte do irmão, Luiz Ribeiro abandonou a Amazónia e instalou-se no Rio de Janeiro, na Tijuca, onde se estabeleceu com um próspero negócio de alfaiataria e tinturaria.
Casou-se, teve pelo menos uma filha e faleceu em 12 de Maio de 1979, no Rio de Janeiro, com a bonita idade de 89 anos.


Luis Ribeiro no Rio de Janeiro, com a sua mulher Isabel Alves e a filha Hilda Alves Ribeiro





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