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Os jovens actuais, sobretudo as raparigas que, então tinham muito menos liberdade, não poderão, em rigor, imaginar como seria namorar, numa aldeia rural, nos anos 40 do século XX.
O caminho da missa, o tempo em que se levava a percorrer, a pé, a distância entre a Ataíja e São Vicente, era a melhor oportunidade para o rapaz dar corpo às trocas de sorrisos e olhares, estabelecer conversa e fazer a proposta de namoro.
Seguia-se um processo, às vezes longo, de formalização da relação: Ela precisava de falar primeiro com as irmãs, naturais aliadas, preparando a comunicação à mãe, o que conduzia a uma conferência entre as mulheres da família, em que se passava em revista o carácter do rapaz, a sua aparência e comportamento, o apego ao trabalho, as posses e estatuto da família, a estima de que gozava, ou não, as relações entre ambas as famílias.
Se aprovado, havia que comunicar ao pai que, então, mesmo que o quisesse, já não tinha grandes hipóteses de se opor à decisão feminina.
A partir daí, a conversa em público ficava autorizada e, algum tempo depois, o namoro podia ir até à porta da jovem, onde, nas tardes de domingo, tinham lugar longas conversas, com o rapaz sempre de pé e ela, por vezes, mostrando as suas habilidades, costurando ou bordando.
Se o pai dela entrava ou saía de casa, ele e o namorado não trocavam mais de três palavras: “Adeus ó fulano”. “Adeus ti’Sicrano”.
A entrada do rapaz em casa da namorada só acontecia com o pedido formal de namoro que, na verdade, era uma declaração da intenção de casar. Havia, aí, lugar a um pequeno sermão, geralmente a cargo da mulher que falava, sobretudo, da honra: O que estava interdito ao pretendente era falsear a confiança que se lhe dava, pôr em causa a honra da rapariga e da família.
De ambas as famílias.
O namoro passava, agora, a ter lugar dentro de casa, sob a vigilância constante da mãe, da avó, ou de uma irmã ou irmão mais novo.
O contacto físico estava interdito, só podendo ter lugar em bailes – também, sempre, atentamente vigiados – ou às escondidas.
O namoro dos meus pais foi, mais ou menos, assim.
O dia de maior liberdade consentida, há-de ter sido o dia 29 de Junho de 1944 (ou 1945?), nas festas de São Pedro, em Porto de Mós, onde um grupo de jovens ataíjenses de deslocou sem vigilância paternal.
Caminho feito, a pé (uns bons 24 km, ida e volta), os sapatos da minha mãe, especialmente comprados, viram um fanico numa tarde inteira a dançar e tiveram de ir, de seguida, para o sapateiro.
Houve tempo, ainda, para uma fotografia, à la minuta:
Tinham, ela 18, ou 19 anos e ele 22, ou 23.
Casaram-se em 28 de Dezembro de 1946.
Faz hoje 65 anos.
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