quarta-feira, 9 de novembro de 2011

A Capela de Nossa Senhora da Graça

da Ataíja de Cima


Construída no Século XVI, a primeira notícia escrita conhecida da ermida de Nossa Senhora da Graça, da Ataíja de Cima, é-nos dada pelo autor anónimo do “Couseiro”, obra que terá sido escrita em meados do Séc.XVII (seguramente, antes de 1657).

Como já referimos num outro post, ao inventariar as capelas da Freguesia de São Vicente de Aljubarrota, o autor do “Couseiro” refere-se à Ermida de Nossa Senhora da Graça, na Ataíja de Cima, dizendo que à respectiva fábrica (quer dizer, sustentação) “estão obrigados os moradores do mesmo logar”, explicando, na parte relativa à Capela de Santa Teresa, nos Casais, que a fábrica das capelas dos lugares era encargo dos respectivos moradores “porque estas ermidas foram feitas para a administração dos Sacramentos”.

Não deixa de ser curiosa esta explicação porquanto, dos sete sacramentos (actos de purificação das almas) da Igreja Católica: o Baptismo, a Confirmação (Crisma), a Eucaristia, a Penitência, a Unção dos Enfermos (Extrema-Unção), a Ordem (ordenação sacerdotal, reservado aos sacerdotes) e o Matrimónio, (ver Catecismo da Igreja Católica, in http://www.vatican.va/, parágrafos 1210 e seguintes), apenas três, a Eucaristia, a Penitência e o Matrimónio, são praticados numa capela rural, ou seja, a explicação é redundante, desde logo, também, porque todos os templos católicos são feitos para a administração dos sacramentos.

Quanto às características físicas da ermida, o “Couseiro”apenas  diz que “a imagem da Senhora é de vulto (é uma escultura a três dimensões), pintada, sem nicho, nem retábulo, nem sino” e, se compararmos esta descrição com as que faz, por ex., da ermida de São Sebastião, na Ataíja de Baixo, da qual diz que tinha “alpendre de colunas”, ou da ermida de São João Baptista, nos Olheiros que refere como “muito formosa” (e, continua a sê-lo, estando, aliás, em curso o processo para a sua classificação como monumento nacional), então, devemos concluir que, naquele tempo, (cerca de 1650, relembre-se), nada mais havia de notável na ermida de Nossa Senhora da Graça, da Ataíja de Cima.

Passados mais de cem anos, em 1758, o relatório do cura de São Vicente de Aljubarrota, inserto nas Memórias Paroquiais, dá-nos conta que: “a capella de Nossa Senhora da Graça cuja Imagem parece tam bem antiga e de pedra é do povo daquele lugar que se chama Ataija de Sima esta capella esta em um largo no meyo do lugar…….. alguns rendimentos que tem que servem para a fabrica da dicta Capella e festa da mesma Senhora que la faz em dia da oitava do Natal e nesse dia acode a ella bastante gente dos povos vezinhos, e tem também esta capella em o altar a imagem do Menino Jesus”.

Este texto nada nos diz sobre como seria a capela naquele tempo. Apenas acrescenta, ao que já sabíamos pelo “Couseiro”, que se situa num largo, no meio do lugar, que sobre o altar há, agora, uma imagem do Menino Jesus e que a festa da padroeira se realizava, nesta época, no dia 1 de Janeiro.

O facto de o “Couseiro” se referir a uma ermida e as Memórias Paroquiais falarem de uma capela, pode querer significar, se os vocábulos estão correctamente usados num e noutro caso, algum desenvolvimento urbano ocorrido na Ataíja de Cima entre meados dos Séculos XVI e XVII. É que ermida significa pequena igreja erecta em sítio ermo, desabitado, enquanto capela significa pequena igreja que apenas abre em determinados dias do ano e as Memórias Paroquiais afirmam que esta, agora, se situa no meio da povoação.

Não conhecemos outras fontes escritas que, até ao Séc.XX, se refiram à Capela de Nossa Senhora da Graça, da Ataíja de Cima.

Não sabemos, assim, quando a festa da padroeira terá passado a celebrar-se no dia 2 de Fevereiro. Como não sabemos quando nela terá sido colocada a imagem de Santo António, ou começado a celebrar-se a respectiva festa. Como não sabemos, ainda, quando lhe terá sido colocado o sino, nem as peanhas que ladeiam o nicho da Padroeira nem, mesmo, este nicho que, no entanto, face ao seu desenho, talvez seja da primeira metade do Séc. XVIII (o que, aliás, seria coerente com o desenvolvimento que a povoação terá tido nessa época).

Quanto à época da construção inicial da capela e da colocação nela da imagem da padroeira, parece não haver dúvidas, sendo os textos unânimes em aceitar que terá sido no Séc. XVI. É o caso, por exemplo, de Tesouros Artísticos de Portugal, Almeida, J. A. Ferreira de, (orientação e coordenação), Edições da Selecções do Reader’s Digest, Lisboa, 1976, onde se refere a capela de Nossa Senhora da Graça nos seguintes termos: “Situa-se em Ataíja e guarda uma escultura de pedra quinhentista representando o orago, prejudicada por uma infeliz repintura. Neste lugar existiu um convento de frades, hoje reduzido à fachada setecentista, brasonada”.

Sobre a “infeliz repintura”, dizia-me o meu pai que terá sido feita na viragem do Séc. XIX para o Séc. XX, por Raul da Bernarda.

E, na Ataíja, nunca houve um convento de frades.
Donde, mais uma vez se prova que não é prudente acreditar em tudo o que se ouve ou se lê.


 
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