O local onde, há vários anos, a empresa de origem canadiana, Mohave Oil & Gas, vem a realizar prospecções na busca de hidrocarbonetos, na concessão designada Aljubarrota, é o mesmo sítio a que chamávamos Fiéis de Deus (fiais de Deus, dizia-se na linguagem corrente), a oeste da Ataíja de Cima, entre os matos dos Murtais, o Cadoiço e a Quinta do Mogo.
Trata-se de uma terra baixa, plana, com boa aptidão agrícola, no vale sedimentar por onde corre a Ribeira do Mogo e na exacta fronteira entre os terrenos calcários do Lusitaniano da beira-serra, e a zona de colinas do Jurássico e do Cretácio (ver Carta 7, in Carlos da Silva, Alberto Alarcão e António Poppe Lopes Cardoso, “A Região a Oeste da Serra dos Candeeiros”, Centro de Estudos de Economia Agrária, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1961).
Uma boa parte destes terrenos foi, ao longo do séc. XIX e até aos inícios do séc. XX, adquirido por famílias ataíjenses, num processo longo que passou, também, pela libertação dos foros que os oneravam.
É o caso, por ex., da venda que, em 05-04-1829 e pelo preço de 21$000, fizeram Bernardo de Sousa e mulher Maria Joaquina, do Cadoiço, a José da Trindade, do Casal do Pereiro, de “uma terra de pão com sua testeira de mato aos Fiéis de Deus, que confronta de Norte com António Carvalho, do Carvalhal, do Sul com Alexandre Rodrigues, de Aljubarrota, Nascente com José de Sousa, do Cadoiço e Poente com José Maria de Sousa, da Ataíja de Cima”. No mesmo dia, e no mesmo cartório do tabelião José Alexandre dos Santos Brilhante, os vendedores celebraram com o comprador uma escritura de constituição de um emprazamento perpétuo, pelo qual ficaram a pagar o foro anual de três alqueires e meio de trigo bom, limpo e capaz de moer, entregues na casa do senhorio.
Este foro veio a ser liberado pela “compra do domínio directo de um foro de três alqueires e meio ou quarenta e nove litros de trigo, imposto sobre uma terra de semeadura aos Fiéis de Deus, de que o comprador é enfiteuta”. O comprador foi Luís Ribeiro, da Ataíja de Cima, sendo vendedores José Trindade Oliveira e esposa D. Maria do Livramento Sousa e Oliveira, de Alcobaça que o possuíam por herança de sua mãe e sogra D. Maria Amália Trindade Oliveira.
O preço foi de 43$000 (escritura celebrada em Alcobaça, em 15-01-1912).
Agora que a importância agrícola daqueles terrenos está fortemente diminuída, ganha corpo a hipótese de ali se conseguir extrair, em condições economicamente interessantes, gás natural.
O que, a acontecer, seria bom mas, mais do que para a região, para o país que muito precisa de reduzir a importação de hidrocarbonetos e a chamada factura energética.
E, nesse dia, o topónimo Fiéis de Deus será esquecido e passará, definitivamente, à história.
Aspecto das instalações de prospecção de gás natural em Aljubarrota-3 (foto de 20-11-2011)
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