segunda-feira, 19 de maio de 2014

Constantino dos Santos - do Hospital dos Expostos de Lisboa a Patriarca de uma família ataíjense - III


Atendendo às idades que lhe são atribuídas nos assentos dos seus dois casamentos, como já vimos antes, (VER AQUI e AQUI) o Constantino terá nascido em 1852 ou 1853. Ora, nesses dois anos entraram mais de 4.000 crianças na SCML (2373 em 1852) das quais 8, pelo menos, foram baptizadas com o nome de Constantino (houve, ainda, uma Constantina e um João Constantino).
Destes 8 Constantinos, 5 faleceram, o mais novo aos 15 dias de vida e o mais velho antes de atingir os dezanove meses de idade.
Dos três restantes, um, entrado na SCML em 25-04-1852 (Lº 26 Matrículas, Varões, fls. 253. Nº 999), foi entregue a uma ama moradora na Tourinha, freguesia de Nossa Senhora do Desterro dos Pousos, concelho de Leiria e aí se manteve até depois dos dez anos, tendo o Termo de Vestir sido celebrado com a mesma ama (Lº 20 de Vestir, fls. 24v.).
Outro, entrado na SCML em 18-09-1853, foi entregue a uma ama moradora no Furadouro, freguesia de São Pedro de Dois Portos, Concelho da Ribaldeira[i] e aí ficou até, pelo menos, os dez anos de idade (Lº Matrículas n.º 33, Varões, fls 461, nº 755).

O terceiro e último dos três Constantinos sobreviventes, entrou no Hospital dos Expostos de Lisboa em 2 de Julho de 1852 e foi baptizado nesse dia com o nome de Constantino, nome da Casa[ii]:

“No dia dois de Julho de mil oito centos cincoenta e dois anos às duas e meia horas da tarde entrou pela Roda para esta Real Casa dos Expostos um Menino com os signais seguintes, camiza e fralda d’algodão, coeiro de baetilha branca, vistido de chita azul, volvedouro(?)  de pano cru, na cabeça meio lensso de/ branco com pintas encarnadas, tudo uzado. Foi solenemente baptizado com o nome de Constantino por mim abaixo assignado; padrinho João Victor Caldas; Ana Candida de Jesus; e para constar fis este assento.
O Pe João Rafael Nunes”
(Lº 130 dos Baptismos, fls. 317v., nº 1226).

No dia 19 seguinte, foi o Constantino entregue à ama-de-leite Maria Joaquina, casada com José Joaquim, trabalhador, moradora no lugar do Carvalhal, freguesia de Nossa Senhora dos Prazeres de Aljubarrota, concelho de Alcobaça.
Entre a SCML e a ama foram celebrados, sucessivamente, os seguintes contratos:

- 11 meses de leite a 1$600, com início a 19-07-1852
- 17$600
- 12 meses de seco a 1$100, com início a 19-06-1853
- 13$200
- 12 meses de seco a   $900, com início a 19-06-1854
- 10$800
- 48 meses de seco a   $500, com início a 19-06-1855
- 24$000
- 36 meses de seco a   $300, com início a 19-06-1859
- 10$800

- 76$400

Chegado, assim, o Constantino há idade de dez anos, foi celebrado com a mesma ama o costumado Termo de Vestir:

Aos 18 de Outubro de 1862 foi entregue a Maria Joaquina. Casada com José Joaquim, trabalhador, moradora no lugar do Carvalhal ……
O exposto Constantino por tempo de seis anos para o sustentar, vestir… etc…[iii]
(Livro nº 20 de Vestir, fls. 166v.)

Criado aqui ao lado da Ataíja de Cima, tudo aponta para que este seja o nosso Constantino, o Constantino dos Santos. Não sabemos porquê, como e quando passou do Carvalhal para a Ataíja. Certo é que, se era criado de servir em casa da ama, criado de servir continuou e assim é identificado no assento do seu primeiro casamento.
Era esse o seu estatuto desde os dez anos de idade: criado de servir.
Como, inequivocamente, se dizia nos Termos de Abertura dos Livros de Vestir, estes destinavam-se a registar os expostos “dados a servir sem soldada”.

Como já vimos antes, o Constantino dos Santos casou, em segundas núpcias dele, no dia 26 de Julho de 1886, tinha então 34 anos de idade, com Serafina de Jesus, solteira, doméstica, de 28 anos de idade e, também ela, exposta da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
Tal como no primeiro casamento, foram testemunhas João Coelho e José Carvalho e, deste último sabemos que foi quem criou a Serafina desde os 5 anos dela.

Do casamento nasceram cinco filhos (o primeiro, aliás, apenas três semanas depois do consórcio), dos quais sobreviveram três:
Maria, nascida em 16-08-1886; José, nascido em 19-01-1890 e outra Maria, nascida em 21-01-1894.

A Maria que conhecemos por Maria Constantina, casou uma primeira vez e ficou viúva com pouco mais de trinta anos e uma filha pequena que foi conhecida por Delfina Constantina e lhe deu dez netos, todos, felizmente, vivos.
O marido, que até agora apenas identificamos pelo apelido Tomás, foi uma das vítimas ataijenses da pneumónica.
De um segundo casamento não houve filhos.

A segunda Maria recebeu, por esse facto, a alcunha de Pequena. Foi, pois, conhecida por Maria Pequena e, às vezes, por Maria Serafina.
Foi mãe de, pelo menos, cinco filhos, dos quais quatro deram origem a uma vasta prole. Estão vivos vários netos.

O José, José Constantino, um dos ataíjenses que integrou o Corpo Expedicionário Português que combateu em França durante a 1ª Guerra Mundial, esse foi pai de sete filhos, dos quais dois estão vivos.

(A "Roda" do Convento dos Cardais, em Lisboa)



[i] Concelho extinto em 1855 e integrado no concelho de Torres Vedras.
[ii] À margem dos assentos de baptismo consta, geralmente, a indicação de o nome ser “da Casa” quer dizer, atribuído por decisão do baptizante ou, “nome do escrito” quer dizer, ser o que constava de algum papel que acompanhava a criança com o pedido de se lhe atribuir esse nome.
Quando havia um papel com indicação do nome a atribuir à criança, essa vontade era, em regra, aceite. Por vezes atribuía-se à criança nome diferente do “nome do escrito”. Em geral, por o nome proposto não ser considerado suficientemente cristão, (por ex., uma criança entrada em 2 de Novembro de 1852, acompanhada de um papel onde se pedia que fosse baptizada com o nome de Leónidas Tubarão, foi baptizada com o nome de Malaquias.
[iii] Veja, integralmente transcrito, o Termo de Vestir relativo à primeira mulher de Constantino dos Santos. 

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