segunda-feira, 10 de maio de 2010

Genta da Ataíja de Cima - Maria Rosalia

Maria Rosalia de Sousa nasceu na Ataíja de Cima em 19 de Agosto de 1912, filha de João Luís de Sousa e de Rosalia de Carvalho e morreu, em 28 de Novembro de 1984, no IC2, atropelada por um autocarro.

Foi o primeiro de nove partos de sua mãe, de que só vingaram quatro raparigas: ela, duas freiras a que já nos referimos no post “Vocações religiosas na Ataíja de Cima” e, Joaquina Rosalia de Sousa, a mais nova e a única que casou.

Aos dezanove anos adoeceu gravemente, de “tísica”, como então se chamava à tuberculose pulmonar, ao que parece e segundo a memória familiar, contraída quando procedia a limpezas em casa de um familiar que morreu dessa doença.

Durante a doença, de cura longa e difícil, foi sujeita a tratamentos extremamente dolorosos, através da técnica do pneumotórax, a que se submetia em Leiria onde se deslocava com o pai, numa carroça emprestada por seu tio José Luís de Sousa. Para fazer face às despesas dos tratamentos, o pai viu-se forçado a vender uma fazenda. Mas, pode dizer-se, teve sorte: não só se curou como a partir daí teve uma vida cheia e saudável, até aos 72 anos.

Dotada de uma grande energia, trabalhou as terras da família, como se fosse um chefe de família, criou animais domésticos como qualquer mulher do seu tempo, costurou para fora, fazendo obra nova e remendos e, resultado natural da sua rigorosa vivência religiosa, dedicou-se aos outros:

Aos pais de que nunca se separou e amparou na velhice e na doença (o pai faleceu com oitenta e três anos e a mãe com oitenta e oito, esta sofrendo de paralisia resultante de um “ataque”, um AVC, que a levou a passar os últimos vinte anos de vida numa cadeira de rodas).

Aos sobrinhos de quem foi uma segunda mãe e dos quais sempre tinha alguns em casa.

À Igreja que serviu como catequista, como zeladora das missões franciscanas, cuidando do altar de N. S. de Fátima na Igreja Paroquial de São Vicente e dos trajes dos Cruzados, cozendo bolos para a festa do Sagrado Coração de Jesus, distribuindo os jornais católicos “A Voz do Domingo e “A Voz de Fátima”, oferecendo almoço ao padre e comitiva por ocasião da visita pascal, organizando pequenos ranchos que nos meses de verão faziam peregrinações a Fátima e cantando na missa com uma característica voz tremida.

Aos outros serviu - e esta é faceta da sua vida que tenho mais viva na memória – como a enfermeira que dava as injecções (o que aprendeu com o Dr. Gedeão) aos doentes da aldeia e das aldeias vizinhas, Casais de Santa Teresa, Cadoiço, Ataíja de Baixo e Casal do Rei, chegando a ir até aos Molianos, deslocando-se, quando o tratamento do doente o exigia, mais de uma vez por dia.
E, como dona do único termómetro da aldeia, media a febre e era chamada a acompanhar os últimos momentos dos agonizantes e, se nada mais havia a fazer, rezava e, chegada a hora, ajudava a lavar e vestir o corpo.

Esta vida agitada, durante a qual percorreu, sempre a pé, incontáveis quilómetros, fosse dia, fosse noite iluminando o caminho com uma lanterna de azeite, fizeram dela uma profunda conhecedora de toda a região e uma mulher rija, sem medos e desembaraçada.

No casamento de sua irmã (31-12-1944) a família, muito católica, não queria baile (como nas suas cartas de Paris a irmã freira insistentemente recomendou). Mas um irmão do noivo, Porfírio Coelho, queria e contratou o tocador para animar a festa. Sabendo disso, a Maria Rosalia meteu-se de noite ao caminho e foi até Évora de Alcobaça (a pé, claro) avisar o tocador para não ir, que uma irmã da noiva que estava em França tinha morrido. O que não era verdade, mas podia ter sido já que estávamos em plena 2ª guerra mundial, a casa-mãe da Congregação de São José de Cluny, em Paris, foi efectivamente bombardeada e esta freira esteve dada como desaparecida.

De uma outra vez, andando a cozer pão, a porta do forno soltou-se e caiu sobre um pequeno frango que por ali andava, do que resultou ficar o bicho com as tripas de fora enquanto piava angustiosamente. A Maria Rosalia não se atrapalhou: meteu-lhe as tripas para dentro, cozeu-o com agulha e linha e desinfectou-lhe as feridas com mercúrio (mercurocromo).

O frango sobreviveu, cresceu e fez-se um grande galo!


Na fotografia abaixo, Maria Rosalia, então com 63 anos de idade, no casamento da sua afilhada Amália:

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