quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Gente da Ataíja de Cima - O Salazar

O nosso pequeno "Salazar", às vezes dito o Salazar do Mogo era, também, conhecido por Manuel Matias ou Manel do Mogo, onde morava pelo casamento com uma filha de José Faustino, nasceu na Ataíja de Cima, filho de Matias Ângelo.
Era o Regedor da Freguesia e foi vereador da Câmara Municipal de Alcobaça.
A alcunha veio-lhe do poder que, no tempo da ditadura, o cargo lhe dava e exercia e excedia sem pudores. Uma das suas fontes de rendimento eram as propinas que recebia dos fregueses pelo exercício das funções de mediador social que desempenhava nas mais diversas situações, designadamente como conselheiro dos bancos alcobacenses, à porta dos quais passava as segundas-feiras, dia de mercado.
Se um camponês analfabeto precisava de um empréstimo bancário, para comprar um pedaço de terra ou uma junta de vacas, tinha de arranjar um fiador e obter o aval verbal do Regedor que garantia ao gerente que podia fazer o empréstimo porque o mutuário era gente de confiança.
O camponês, agradecido, queria pagar o favor e ouvia a resposta dada em voz grossa: "Não é nada rapaz, vais lá um dia com as vacas".
Quem não tinha vacas ia também.
Era assim que conseguia, quase sem despender um tostão, trazer cultivada a parte do Olival dos Frades que lhe coubera em herança do pai.
Sempre o conheci de fato preto, casaco assertoado e chapéu, como o Salazar ele próprio.
Montado numa égua, (coisa rara em terra onde os pobres não iam além do burro e os remediados da mula) estou a vê-lo a distribuir, a residentes seleccionados pelo seu critério pessoal, os boletins de voto que obedientemente seriam depositados nas urnas no domingo seguinte, para "eleger" o Almirante Américo Tomás.
Este nosso Regedor era mais temido (e usado) que respeitado. Os que tinham ido à tropa (ele não) riam-se da cena em que, durante a missa e à frente de um grupo de Legionários que prestavam guarda de honra ao altar, deu convicto a ordem: "armas ao ombro!" (a expressão militar, correcta, é: Ombro! Armas!) e o meu pai deliciava-se a contar que, discursando o Salazar numa homenagem pública a um professor primário (Ventura?), elogiou o homenageado dizendo deste que,  "... apesar do seu ar enfezado, é um grande homem".

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